terça-feira, 22 de dezembro de 2009

resposta do tempo

o tempo passou devagar nesses ultimos dias. o tempo na verdade se arrastou, brincou de esconde-esconde comigo, fez que ia e nao foi. o tempo: ele sabia que eu precisava ir devagar com o andor, ele sabia que eu precisava viver hoje, agora, o momento exato. eu tambem sei disso, mas vivo a me esquecer e, depois de um tempo (olha ele de novo!), acabo agradecida ao tempo.
hoje foi um dia de revelacoes, de encontros, de re-afirmacoes.
me reecontrei com a professora que tenho em mim, ela andava adormecida pelas frustracoes de um semestre dificil, atraves de uma aluna que comecou sem nenhum entusiasmo e terminou virando a melhor aluna da sala. e que escreveu um cartao pra professora, no qual agradecia pela disciplina desafiodora que a ensinou a buscar o melhor. a professora passou o resto do dia a saborear a realizacao: muito melhor que ensinar os aspectos tecnicos da ciencia, eh bom participar da preparacao desses jovens para a vida. eh importante vencer um desafio, pois ele nos ensina que podemos. nao importa qual desafio esteja a frente: buscar o melhor eh o caminho. a aluna pode ateh esquecer o que eh uma comunidade, uma celula, uma abelha, uma mitocondria. mas que ela nunca esqueca que eh capaz de vencer desafios porque busca sempre o melhor. a professora, com certeza, jamais esquecera do brilho daqueles olhos.
eh importante conhecer a tecnica, mas tecnicas soh sao uteis de verdade se somadas a intuicao. a tecnica sozinha nao resolve os desafios do ensinar, porque ensinar nao eh exato - eh humano. e requer que o professor use todas as ferramentas que possui, incluido a intuicao.
o mesmo tempo que brincou comigo ao longo das ultimas duas semanas, hoje passou rapido e sereno. de malas prontas, eu espero soh a hora de ir, que chega jah. e espero feliz, cheia de esperanca: 2010 ha de ser melhor que 2009.
ateh 2010, estou lah. estou com eles. estou inteira.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

urgencia

a vida nos ensinou a urgencia. nem todos a aprendemos ou a adotamos pro dia-a-dia, porque, como todo grupo de seres vivos, somos variaveis ateh na forma como reagimos a vida. mas que a vida jah nos ensinou a urgencia, nao dah pra negar. a vida nos ensinou que somos todos finitos. pra mim, eu ser finita nao eh problema algum, dificil pra mim sao eles serem finitos. a vida nos ensinou que estar juntos de alguma forma alivia a dores que vem junto com aprender a urgencia e a finitude.
talvez por isso que esse ano, depois da gente ter digerido e convivido com a urgencia e a finitude, esteja sendo tao dificil esperar pro dia de nos encontrarmos na terra de iracema. talvez por isso esse tempo que nao passa, essa ansiedade que nao se vai nem no sono. talvez por isso, ontem numa tarde de frio e nuvens da nova inglaterra, eu tenha feito as malas, a despeito do tempo que nao passa, do tempo que ainda falta passar ateh o dia de ir.
parece que a vida nos ensinou a urgencia e a urgencia nos ensinou a ansiedade.
de malas feitas, eu continuo a contar os dias.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

passagem

hoje eh quarta-feira e eu comecei a contar os dias: vou encontrar-me com iracema em quize dias. hoje eh quarta-feira e eu comeco a me preparar pro ritual de passagem, dessa vez mais longo, que se inicia em dezembro e soh deve acabar lah pra maio. hoje eh quarta-feira e eu jah sinto o cheiro da tapioca na chapa, do carangueijo no leite de coco, do filet migon que se faz numa casa ao sul do equador, na cidade do sol e de sao jose, no bairro que leva um nome familiar. escuto o murmurio calmante da fala em portugues, escuto os carros que passam na desembargador moreira ou na antonio salles, abro os olhos e posso ver tres pares de olhos a me fitar, a me chamar pra brincar, pra amar, pra viver. escuto a voz infantil que diz que vai dormir comigo, escuto a mae a protestar - "ela mexe muito durante a noite!" - e me vejo cedendo, pois a tia que eu sou sempre cede pras coisas boas da vida. e tem coisa melhor que um chamego de noite? escuto as conversas todas, regadas a boa companhia: a comadre, a prima, a irma... escuto a conversa que acontece numa casa do papicu, onde ha tambem outras de mim.
conto os dias, saboreio a espera. ateh lah.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

desabafo

to propondo uma emenda a declaracao dos direitos humanos: que todo mundo que eh infeliz, tem problemas serios, estah com infeccao no inconsciente*, sofre de disturbios da saude mental seja obrigado a procurar ajuda. pra melhorar logo e ponto. pra deixar de, voluntaria ou involuntariamente, fazer os outros infelizes. e nao importa se eles vao buscar ajuda d'um psicologo, psiquiatra, psicanalista, pai-de-santo, pastor de igreja evangelica. desde que essas pessoas parem de maltratar o mundo.

felicidade e sanidade mental, quem quer ter, corre atras. do jeito que for. porque a vida eh muito curta.

agora, eu vou dormir. amanha eh outro dia e vai ter sol na nova inglaterra.
boa noite.

* infeccao no incosciente: mais uma expressao do dicionario de marly, utilizada para referir-se a depressao, baixo astral, calundu.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

cumade

a vida eh feita de momentos, alguem vai dizer. faz tempo jah que nao acredito nisso... minha pouca experiencia me diz que a vida eh feita de pessoas; essas, sim, fazem, determinam, moldam como hao de ser os momentos da nossa vida. ao longo da caminhada da vida, vamos acumulando pessoas, que nos propiciam momentos, que partilham momentos, que marcam momentos, que definem momentos. algumas dessas pessoas sao barreiras, marcos de momentos dificeis. outras, em contrapartida, sao presentes, marcos de momentos bons.
essas, as que marcam bons momentos da minha vida, se eternizam. como a minha comadre... como tudo que a gente partilha, como o amor que a gente troca, como o apoio a gente se dah quando tem alguem com a corda no pescoco. de mim, nunca passa despercebido quando ela tira minutos (muitos!!!!) do tempo contado que ela tem pra me dar de presente, pra conversar ao telefone, pra me contar as ultimas do meu afilhado, pra me dizer uma palavra de estimulo. nunca.
alem de comadre e amiga indispensavel, ela eh meu modelo de mae. quando eu for mae, quero ser igual a ela, sem tirar nem por. ontem, a filha mais velha veio ao telefone pra contar pra tia mari sobre o ela mesma chamou de noite mais feliz da vida: uma festa surpresa, com algumas amigas, organizada pela mae atenta e cuidadosa, que ouviu um desejo da filha. um desejo bobo, que a muitos passaria batido. mas que a comadre sabe ouvir como ninguem. nao, nao eh fazer vontade - eh parar pra ouvir, eh ver o filho como ele eh, nao como se imagina. eh perceber que o filho pode, sim, ser diferente de si, e que isso nao lhe faz ser menos.
elas dormiram felizes, numa noite que uma crianca se sentiu amada e uma mae viu o sorriso mais feliz desse mundo iluminar um bairro inteiro de uma cidade no nordeste do brasil.

domingo, 29 de novembro de 2009

novembro

novembro, pra mim, foi mes de falar pouco. novembro foi o mes de escutar, nao o que me diziam as pessoas ao meu redor. foi o mes de escutar o que me diz o universo, em constante mutacao e conspiracao - a favor, assim eu acho. novembro foi o mes de ter certeza, de perceber os sinais, de encontrar as respostas nos acontecimentos mais causais, sem qualquer ligacao aparente com o acontece de fato na minha vida.
pela primeira vez, em seis anos de eua, por pouco nao tive programa pro thanksgiving, feriado em que as familias se encontram. nao foi por acaso, nao pode ser. pela primeira vez, desde que comecei a falar em voltar, alguem me fez uma proposta concreta de trabalho. e uma outra possibilidade comecou a tomar forma, ainda muito incipiente, mas jah com alguma forma. nao foi por acaso, nao pode ser.
passei mais um feriado prolongado sozinha em casa. o telefone nao tocou, a nao ser pelos de sempre, aqueles que estao sempre presentes. mas jah aprendi a lidar com a situacao. e sou eternamente grata pela existencia dos bons livros, do cinema e da musica, que ocupam o tempo e os espacos vazios. sei, e sinto, que nao estou soh.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

pra encontrar iracema

ela me espera. ainda virgem, mel nos labios, cor na pele. ela se banha nas aguas calidas daquele mar verde, brinca de subir e descer com as ondas da praia do futuro. ela me espera enquanto eu ainda sinto frio e vejo o mundo seguir em frente todo dia.
daqui a um mes, a encontro (quase) como a deixei no comeco de junho, depois dos dois aniversarios mais felizes de 2009. um celebrado numa fazenda do sertao, regado a amor, cerveja e musica. o outro celebrado no asfalto da cidade, regado a amor e cerveja.
ela vai me ofercer carangueijos, peixes, filet da vovo. ela vai me oferecer o mar verde. ela vai me permitir ver o caminho, que jah estah tracado, embora longe do meu alcance. ela vai me oferecer o circulo, dentro do qual em tenho a nocao mais completa do que eh pertencer.
a cidade dela eh feia e bonita. me recebe de bracos abertos, me faz ter vontade de ficar. mas tambem me mostra a cara feia, os dentes expostos de raiva, de tristeza, de frustracao, de medo. a cidade eh muita gente.
temos um encontro marcado, eu e iracema. e falta soh um mes.

domingo, 22 de novembro de 2009

todo mundo precisa de bencao

eh melhor ser alegre que ser triste
a alegria eh a melhor coisa que existe
eh a assim como a luz no coracao
mas pra se fazer um samba com beleza
eh preciso um bocado de tristeza
senao, nao se faz um samba nao
fazer samba nao eh contar piada
e quem faz samba assim nao tah com nada
um bom samba eh uma forma de oracao
porque o samba eh a tristeza que balanca
e a tristeza tem sempre uma esperanca
de um dia nao ser mais triste nao
ponha um pouco de amor numa cadencia
e vai ver que ninguem no mundo vence
a beleza que tem um samba, nao
porque o samba nasceu lah na bahia
e se hoje ele eh branco na poesia
ele eh negro demais no coracao
vinicius de morais e baden powell

cantei o samba, ontem, enquanto nao sabia o que fazer com aquele dia lindo que se descortinava, com o brilho do sol na agua do kenoza lake, com o vento gelado que me acordava a musculatura e dizia: corra, corra, corra. cantei, cantei, cantei. e por osmose ou insistencia, a letra da cancao me ensinou a licao: quando a tristeza bate a porta, eh favor deixar entrar. ela precisar se instalar, pra poder, um dia, ir embora. deixei minha tristeza entrar. fiz dela minha companhia, beberiquei sua docura com vinho, utilizei-a de tempero pra carne, pro sangue. de combustivel para pulsacao que nao para em minhas veias. ela chegou, juntou sua cadencia a minha, fez tum-tum junto com meu coracao. e foi.

domingo, 15 de novembro de 2009

a vida nao para enquanto tudo dentro de mim estah parado, esperando o ano que vem, esperando maio, esperando a mudanca que planejei. chove, faz sol, as criancas brincam na rua, o cinema exibe filmes novos, o mes caminha do meio pro fim com uma rapidez incrivel. a agua passa cada vez mais rapida embaixo da ponte. a vida nao para enquanto eu aturo, as custas de muita energia, os piores alunos que eu jah tive na vida. a vida nao para nem mesmo porque aqueles a quem amamos jah nao estao mais perto. nao, de jeito nenhum, nem por um minuto a vida para.
eu aprendi a ter pressa. aprendi que era preciso correr, ir atras, dizer o que se sente. era preciso nao deixar que as oportunidades passassem. nem sempre eu consigo, mas o apredizado tah aqui. e eh por isso que ficar parada - esperando maio, esperando o ano que vem, esperando dezembro, o natal, os encontros todos, nosso reveillon na praia - eh dificil pra mim. desde o ultimo verao, quando a decisao ficou clara, mesmo quando eu ainda sofria com a despedida, percebi que andava cozinhando minha vida em banho-maria. nao me permiti fazer novos amigos, nao me permiti viver nenhum amor, nem mesmo uma paquera sem grande repercussao. eu sei qual o caminho em que preciso caminhar.
faz muito que nao tem duvida nem no meu pensamento, nem no meu caminhar. eu sei o que eu quero, sei o que eh preciso fazer. tenho medo, sim; esse estah sempre por perto, mas nao nao consegue me fazer parar. assito da minha janela a vida que segue. a vida segue sempre.

domingo, 1 de novembro de 2009

prece

leveza

delicadeza

generosidade

alegria

partilha

fe

amen.

sábado, 31 de outubro de 2009

this is it

nao sou fa do michael jackson. nunca fui. nao fui um daqueles que se embasbacou ao ver o clip de thriller, nao sei todas as musica dele de cor e salteado, nao sei dancar como ele, nao sou nem mesmo uma grande fa do pop. reconheco, entretanto, o talento que lhe construiu a fama. e, por isso, me incomodavam profundamente as esquisitices dos seus ultimos anos; um homem tao talentoso nao precisa disso, era o que eu pensava. ele soh precisava do seu talento, do dom pra seguir fazendo sua musica.
fui hoje assitir ao this is it, filme feito com as filmagens dos ensaios pra seu mais recente espetaculo. e nao dah pra nao se deixar contagiar com a batida, sobretudo quando michael jackson acompanha milimetricamente cada batida com algum movimento de seu corpo. eu sempre me impressiono com pessoas que amam seu oficio; nesse mundo em que tantos trabalham soh por obrigacao, gosto de ver quem trabalha com e por amor. e foi essa a minha sensacao ao ve-lo ensaiar, interagir com os dancarinos, musicos e equipe.
o menino ao meu lado, vestido com a luva brilhante e os oculos escuros, esqueceu-se que estava no cinema e se mexia na cadeira e cantava como se estivesse na sala de sua casa. tive vontade de tira-lo pra dancar, tive vontade de chamar todo mundo dentro daquela sala de cinema pra, juntos, dancarmos ao som dos ensaios de michael jackson.
vim pra casa ainda com os pes fervendo com vontade de se render ao ritmo. vim pra casa com o brilho do olho do menino ao meu lado gravado no meu olho. eh das criancas, sempre, a reacao mais genuina.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

a tia neile disse, num dos momentos dificeis que vivemos nos ultimos anos, que o vovo firmino ficaria muito orgulhoso ao ver tanto amor circulando entre os seus. essa frase ecoa na minha cabeca desde entao, toda vez que a gente faz circular esse amor que nos une. toda vez que todo mundo faz um esforco danado pra estar junto, toda vez que algum precisa e outros estao lah de bracos abertos, maos estendidas. somos mais felizes por isso.
mila passou hoje por uma cirurgia. era um procedimento relativamente simples, mas uma cirurgia eh sempre uma cirurgia e a gente sempre tem um pouco de medo. mas o medo, a apreensao natural do momento sao infinitamente menores que a certeza de que estamos todos vibrando no mesmo tom. quem pode ir, foi. quem nao pode, ficou de longe e se fez presente de algum jeito. na diversidade que nos eh caracteristica, houve quem rezasse, houve quem dancasse, houve quem pensasse positivo. mas nao houve ninguem que ignorou, esqueceu ou subestimou o que estava acontecendo.
mila acordou da anestesia pra encontrar oito olhos de amor a lhe fitar. e mais nao sei quantos espalhados por aih, sem poder fita-la, mas a ver sua imagem refletida na cornea o dia inteiro. do mesmo jeito que ela ficou feliz ao receber os que foram de longe e ao ler os emails de boa sorte de ontem, hoje ela ficou feliz com um monte de telefonema, todo mundo querendo fazer um pouco, tantas maos estendidas naquela direcao.

domingo, 25 de outubro de 2009

na conversa de ainda agora:

- tia mari, quantos anos voce tem?
- eu tenho 33, e voce, quantos anos tem?
- eu tenho 5.
- eu tambem quero ter 5 anos, vou comecar a contar a todo mundo que essa eh a minha idade.
- as pessoas nao vao acreditar...
- nao? porque?
- porque voce eh grande, maior que eu, neh? assim, os adultos nao vao acreditar, soh os beberes talvez acreditem...

"... pra lah desse quintal, era uma noite que nao tem mais fim..."

a musica me chegou via rio de janeiro, e, embora seja cantada em italiano, me diz em portugues muito claro que eu nao estou sozinha no mundo. baixei a musica no meu ipod, pra escutar em dias como hoje, em que eu brinco com a solidao ao meu redor. outras mensagens chegaram e continuam a chegar todos os dias: nao, elas dizem, voce nao estah nunca soh, pode estar soh em haverhill, pode estar soh no espaco imediato que te circunda. mas nunca, jamais, estah soh no mundo.
sei bem onde fica o meu quintal, que nao estah nunca vazio, onde nao fica escuro nunca. meu quintal movel, meu quintal magico, que se muda, se molda ao necessario. que nos abriga todos, que nos da casa, que representa o ponto no espaco inifinito pra onde nos todos podemos voltar a qualquer momento. essa semana, o quintal se muda pra salvador. obvio, nao vai vazio. obvio, se molda a necessidade do momento. os habitantes desse quintal, mesmo os que nao se mudam junto com ele, podem se dar as maos. cada mao em sua propria coordenada. tantas maos que, juntas, subvertem a logica, a geografia, a fisica, a biologia. somos todos, dentro desse quintal, um soh.

meus escritos hoje, junto com meu amor eterno, sao pra ela.
na terca, minha energia, minha feh, junto com meu amor eterno, serao pra ela.

sábado, 17 de outubro de 2009

metafora


no outono, nos despedimos. vao-se os dias de calor, em que as pessoas se abrem pra vida, se abrem pros outros. vai-se, por meses, a possibilidade de tirar da terra o alimento. vai-se a possibilidade de brincar no parque, de usar chinelo de dedo, blusa de manga curta, tomar sorvete sentado na mesinha ao sol da sorveteria. despedimo-nos do sol que, nos proximos meses, vai nos chegar frio e distante, quase querendo nao vir.

no outono, eu me despeco. nao sem um pouco de melancolia, que eh a melancolia o lado mais belo da despedida. caminho por estes caminhos que me fizeram a vida nos ultimos anos pela ultima vez, sorvendo as sensacoes, esticando a memoria, criando paralelos na minha cabeca inquieta.

mas a luz do outono nao permite que esse tempo de despedidas seja triste. olhamos todos pra frente, para a possibilidade do branco infinito da neve, a maciez inigualavel daquele mar alvo que ha de nos ocupar todos os espacos dentro em breve. eu olho pra frente tambem, e vejo o brilho do sol do equador, vejo as areias brancas de iracema, vejo o verde intenso na mata que cobre a montanha ao sul da cidade, o calor que ha de me acompanhar o dia-a-dia.

a infinidade de tons de vermelho, amarelo, roxo e cor-de-laranja colore de beleza a melancolia que me enche o espirito em dias como hoje.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

um beijo pra tu

eh heranca familiar, terminar conversas ao telefone com um sonoro um beijo pra tu, dito assim tudo junto como se fosse mesmo umbeijopatu. aprendemos o habito carinhoso com o vovo firmino, que encerrava todas a ligacoes assim. comigo, ele jah esperava caladinho, quando a ligacao ia chegando ao fim, que eu dissesse: vo, um beijo pra tu! e ele, invariavelmente, respondia: um beijo pra tu, mulher doida! tudo dito com entonacao caracteristica que meus ouvidos, ainda bem, nao esquecem. tudo cheio de carinho, do avo que nao tinha mesmo muita paciencia com as criancas barulhentas que foram alguns de seus netos, mas que mesmo assim sempre levava pedacos do grupo pros tradicionais fins-de-semana na serra. e que curtiu muito as conquistas e o desenvolvimento de cada um mais pra frente na vida. do avo que contou com quantos anos eu iria defender minha tese quando entrei no doutorado, que vibrava com minha realizacao pessoal e profissional e se preocupava com as cabecadas que eu dava na vida.
hoje, tinha dois emails terminados com um beijo pra tu na minha caixa de correio. heranca familiar que me faz vir aqui e continuar a ser repetitiva. esse blog tah virando variacao do mesmo tema, eu sei. entao eu explico que meu ponteiro tah apontado pro sul e, sobretudo nesse ultimos momentos dificeis, tem sido eles a minha forca e inspiracao. e continuo, porque nao ha outro jeito, a ser assim monotematica.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

luz do meu dia

quando o telefone toca fora de hora, nem sempre eh coisa ruim, como reza o medo de quem mora longe da familia. quando toca o telefone fora de hora, no meio do dia, pode ser ela pra dizer que ouviu uma conversa sobre a volta da tia mari. pra dizer que ficou feliz que a tia mari vai morar pertinho, que sabe que eh por causa dela que a tia mari volta, que quer saber em que casa a tia mari vai morar. vai dar pra ir andando? vamos nos ver todos os dias? voce nao vai mais viajar? quando eh que voce chega?
quando toca o telefone no meio do dia, pode ser soh o amor que fala sempre mais alto. podem ser os lacos que se manifestam tao doces, tao completos nessa imensidao de atlantico que ainda, e soh por enquanto, nos separa.

espera aih, meu amor, que eu to chegando.

"...como o arco da promessa
do azul pintado pra durar..." (beto guedes e ronaldo bastos)

domingo, 4 de outubro de 2009

minha mae me acordou de madrugada, de quinta pra sexta. me chamou como soh ela me chama, chorou de saudade e disse das belezas de lah. me fez sentir como soh ela me faz. me acordou do sonho e mandou-me de volta pra ele, transicao perfeita, linear. acordei no dia seguinte com as palavras da adelia na cabeca.

Solar
Minha mae cozinhava exatamente:
arroz, feijao-roxinho, molho de batatinhas.
Mas cantava.
Adelia Prado

do pouco que eu sei

alguem vai dizer que viver nao eh facil. que nao tem manual de instrucoes, roteiro pre-definido, bula com contra-indicacoes e efeitos colaterais. alguem vai dizer que daqui a gente soh leva o essencial, o que nao ocupa lugar no espaco, muito menos tem massa. alguem vai dizer, assim com cara de filosofia, de quem sabe muito, que a vida eh dura.
eu me permito discordar, pra nao me preocupar a toa e deixar de viver enquanto. me permito a rebeldia de seguir e sorrir, mesmo nas horas mais escuras. permito musica nos meus ouvidos, gosto do apito e do barulho do trem. gosto das folhas coloridas que caem no outono e das verdinhas que brotam da noite pro dia na primavera. gosto do verde do mar, do turvo da agua do rio que passa logo embaixo da piscina da serra. gosto do sol quente e do sol frio, da chuva e da neve e ateh da seca. admiro o casulo que um dia vai ser borboleta, sem dele precisar nenhuma explicacao. gosto do barulho das criancas que atrapalham a minha conversa ao telefone, interrompem o papo serio pra perguntar que dia eu chego.
nutro aquilo que ha dentro: planos, sonhos, desejos, enfim. nao eh minha intencao planejar, mas nao posso dizer que soh vivo hoje. tambem gosto do que estah no meu exterior, cuido bem da casca e gosto daquilo que, eu sei, nao eh essencial. gosto de bolsas e sapatos, mas sei que eles sao soh o que sao. queria dizer que nao preciso provar nada a ninguem, mas nem sempre ajo de acordo. luto todo dia contra esse bando de verbo no preterito do futuro que circula pela minha cabeca. perco algumas dessas batalhas, mas sigo lutando.
isso, sim, sem precisar provar, eu tenho em mim. resistencia e resiliencia que vem de longe, que viram dureza em alguns momentos, que ateh me assustam em tempos. mas que me seguram quando a poeira me impede de ver o que ha em frente, quanto o incerto eh maior que o certo.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

thanks god it's friday

sexta-feira, e eu jah acordo com o pensamento no sabado, no dia que eu durmo enquanto meu corpo quer, que eu faco muio ou pouco, ao meu prazer e contentamento. dia em que eu nao preciso ir a nenhuma reuniao, nao preciso me comportar do jeito que a ocasiao ou o ambiente pede. posso soh ser eu, ficar em casa, descabelada ou me arrumar toda e sair por aih. mas sou soh eu. posso olhar o mundo que se colore ao meu redor, o tempo que muda, os passaros que voam pro sul, as pessoas que se preparam pro inverno.
a gente viu essa sexta chegar com um boa noticia: helena tem uma infeccao bacteriana, vai se tratar com antibioticos, vai ficar boa. e a mae dela vai lhe contar daqui a alguns anos, como a gente quase morreu do coracao nesse pouco mais de uma semana que durou essa jornada, que sentimos muito medo, mas que tinha um monte de gente junto conosco nesse caminho. que tinha gente rezando aqui, em porto rico, no brasil e na europa. quando ela crescer o suficiente pra entender direitinho o que ha por tras das palavras que os adultos colocam em frases enigmaticas, ela vai entender o quanto eh amada. soh por ser ela, daquele jeitinho mesmo.
alem de thanks god it's friday, eu digo tambem thanks god, you all exist!

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

referencia

fernando pessoa, no seu Livro do Desassossego diz:

"Escrevo triste, no meu quarto quieto, sozinho como tenho sido, sozinho como sempre serei. E penso se a minha voz, aparentemente tao pouca coisa, nao encarna a substancia de milhares de vozes, a fome de dizerem-se de milhares de vida, a paciencia de milhoes de almas submissas como a minha ao destino quotidiano, ao sonho inutil, a esperanca sem vestigios. Nesse momentos meu coracao pulsa mais alto pela consciencia dele. Vivo mais porque vivo maior."

porque, como diz adelia prado, soh pode com cantiga triste que nao perdeu a alegria.

sábado, 26 de setembro de 2009

ainda exercitamos a espera e processamos tantas informacoes novas enquanto isso. nos ainda temos medo. dormir nos fez bem, embora nem todos tenhamos tido chance desse luxo. nos damos a mao nesse momento, buscamos apoio uns nos outros. eu busco apoio no alem-mar, cruzo oceanos na direcao das palavras de carinho, de gente que consegue ver de fora e me ajuda a enxergar a luz.
agradeco. o apoio de quem nao conhece a menina que estah no hospital, mas que eh capaz de tanto sentimento. os alunos que entendem a necessidade de uma mae ser soh mae e esquecer que eh professora. tudo o que veio dos meus, em formas diversas, grande que nao se mede, indispensavel.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

ainda nao era 5 da tarde quando eu parei naquele sinal. assim, grampeada ao banco do carro, observei o sinal dos carros que dobravam ficar verde, o homem estranho atravessar bem na frente deles, dos carros que cruzavam bem a minha frente. daquele jeito, pesando 250 kilos sobre meu banco de carro, prendi a respiracao, esperando o impacto. e vi, gracas a deus, o carro mais a frente parar a milimetros de distancia do homem.
e fiquei rindo do homem, fazendo o gesto inconfundivel de quem manda alguem tomar banho ou coisa que o valha. respirei fundo e aliviada, passei no correio e me mandei pra casa - estava mesmo na hora do dia acabar. eu ainda tinha ensaio do coral, mas isso eh prazer puro, diversao. o que eu nao sabia era que meu dia ainda nao estava no fim de jeito nenhum. e que eu ainda iria ajudar minha amiga a levar a sua helena ao hospital. helena, a menina dos olhos verdes de gato emoldurados por longos cilios. a menina de personalidade forte do alto dos seus 4 aninhos que gosta de um chamego e me diz que loves me very much. e que a gente iria ouvir coisas que pais, filhos, tio (mesmo que posticos) nunca querem ouvir envolvendo alguem a quem se quer bem.
mais do que a falta de sono, o que me esquenta a cabeca hoje eh o incerto e a possibilidade de nao ser o que eu espero que seja. eh saber que a gente pode ser, subitamente, roubado de algo que a gente sabia como certo, ia acontecer. de nao ter o que a gente sempre pensou ser absolutamente normal.
nesse momento, testes e exames estao sendo feitos e, a nos, soh resta esperar. e torcer, e rezar e pedir que nao seja nada do que se falou ontem naquele quarto de emergencia de hospital, as 2 e meia de uma longa madrugada. e que essa forca maior que existe no universo - a quem damos muitos nomes diferentes - conspire mais uma vez, definitivamente dessa vez, a nosso favor. e faca tudo voltar ao normal.
vovo firmino me contou a historia algumas vezes... numa epoca instabilidade politica no pais (nao lembro exatamente quando), um amigo dele precisa sair do brasil - exilar-se. ele, meu avo, junta um tanto de dinheiro e vai se encontrar com o amigo, arriscando ser preso, mas entrega ao amigo o dinheiro que lhe ajudaria no que estava por vir. o amigo pergunta: quando eu te pago? isso nao importa, eh a resposta do meu avo. valores como esse, historias como essa fazem parte da recordacao forte do meu avo. mais que isso: tenho o imprinting desses valores em quem eu sou hoje. ser leal, generosa e confiavel eh importante pra mim.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

o ceu de setembro

o dia era daqueles que eu torco pra nunca acabar. era um dia em que eu via da minha janela o ceu bem azul, mesmo que houvesse nuvens, chovesse canivete, nevasse. sem precisar esforco, eu sabia da forca do que vem dentro de mim. entre uma musica e outra, das que inundam o meu caminho; entre um aluno e outro, desses que me ocupam os dias, nada pode mudar minha vontade, minha tenacidade. nada abala minha certeza de que, sim, o ceu eh azul. mesmo que a maioria nao veja. mesmo que nao seja de verdade.
a pessoa passou do meu lado de mau humor. num dia como aquele nao me abalou. tornei-me imune: pode falar, olhar, medir de cima embaixo e nada me atinge. eh passado hoje o torpor desse ultimo verao, que veio todinho da quentura da minha propria cabeca. emergir desse sono estival nao foi facil, contei e conto com ajudas muitas, de tantos lados. mas eh fato hoje e me mostra pra qual time eu jogo na vida.
me pergunto todo dia se a gente escolhe mesmo como vai viver ou se a vida nao nos dah muita saida em varios momentos. nao sei a resposta. alguma coisa me puxa pro time dos que nao tem tempo a perder, dos que querem seguir em frente.
voltei a cantar. num coral agora, que eh pra ser divertido. sou a mais nova do grupo que se reune toda quarta a noite em groveland, pra cantar junto e dar boas risadas. de tudo, falta soh uma coisa: cantar em portugues. minha lingua mae me faz mais falta cantada do que falada.

p.s. do tipo "pena que soh descobri agora": um queijo grego que nao derrete e range entre os dentes igual o nosso queijo de coalho. ontem fiz um baiao-de-dois que valha-me minha nossa senhora! eh bom nunca perder os bons costumes.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

da espanha aos eua em trinta segundos


quando fui pra espanha, ano passado, fiz as compras das passagens de trem atraves do site da renfe, a companhia ferroviaria do pais. meu email ficou registrado nos arquivos deles e agora recebo, vez em quando, emails da renfe avisando sobre promocoes, descontos, novas linhas, o que quer que seja que eles queiram divulgar. essa mistura de email com tentacao e tortura vem agucar minha vontade de voltar a espanha, pais que caiu nos meus amores, vem me lembrar os sabores, o cheiros, as imagens daquela terra e, hoje, veio me avisar que o verao no hemisferio norte acaba jah, jah. o email de hoje tratava da ultima promocao desse verao, lembrando-nos que, sim, estamos a duas semanas do comeco oficial do outono.

era de se perceber, pelas noites mais frias, pela jaqueta leve que a gente poe pra sair de casa de manha (e tirar lah pelas dez, por enquanto), que o verao estah indo. mas, mesmo tendo voltado as aulas - marco maior de que o verao se foi - foi dificil cair a ficha de que o outono jah bate a porta. esse ano praticamente nao teve calor. fez frio ateh o meio de junho, choveu ateh o inicio de julho e calor mesmo, desses da gente achar que estah no piaui, soh por uma semana. foi bom, por um lado: a conta de energia nao sofreu com o ar condicionado ligado, um ventilador resolveu pras noites mais quentes. e ruim por outro: cade? eu me pergunto. cade o verao, cade a praia, cade os passeios em boston sem congelar?

vi hoje no parque as primeiras folhas a se colorir, preludio de outono. vai comecar a estacao mais linda de todas do hemisferio norte, quando as folhas todas mudam de cor, e a luz que vem do sol reflete pra gente os tons mais lindos de vermelho, cor-de-laranja, amarelo, roxo, rosa, magenta. um presente que a gente ganha antes do inverno frio e longo.

esse eh, muito provavelmente, meu ultimo outono como residente da nova inglaterra - pelo menos nessa fase da minha vida. fui tomada hoje, enquanto corria no parque, da melancolia da despedida. vivi tantas coisas boas nesses ultimos anos! curti muito os outonos, me deslumbrei tantas vezes com o cenarios cinematograficos a minha volta que meu vizinhos, tendo crescido aqui, tomam por banal, corriqueiro. mas mais que a paisagem espetacular, o que eu vivi eh que importa de fato. as marcas estao aqui comigo, nao sou mais a mesma pessoa que desembarcou aqui anos atras. o que sou hoje passa necessariamente pelas paisagens de new hampshire e massachusetts, pelas pessoas com que convivi, pelos amigos que fiz e que partilharam comigo desses momentos.

o ciclo ainda nao se encerrou, ainda falta um tempo. este outono que vem chegando marca o inicio desta temporada de despedidas. eh, sim, hora de partir rumo ao sul.

domingo, 6 de setembro de 2009

familia tem sido um tema recorrente nesse blog; quem le deve jah estar de saco cheio. mas a referencia eh muito forte, a relacao eh (quase sempre) muito leve, o amor muito grande e, sobretudo nesses ultimos meses, a atencao e o carinho tem sido impares. eu nao sei o segredo, nao sei ao certo colocar em palavras o que fez com que os doze netos da dona zelinda e do seu firmino se quisessem tanto bem, conseguissem manter contato mesmo, ou principalmente, quando estao tao espalhados e encontrassem tanto prazer em estar juntos, em partilhar momentos, sensacoes, sentimentos, historia.
ao que nao me eh palpavel, eu reajo com a emocao - tambem essa, uma heranca familiar. hoje, depois de falar com o dani e com o carlao, me veio uma vontade enorme de chorar, de agradecer a deus, ao universo, a minha mae, a quem quer que seja que tenha me colocado no meio desse povo. e eu chorei sim. enquanto acendia uma vela de agradecimento a nossa senhora, nos pes daquela imagem pequeninha, presente da mae, numa afirmacao da minha feh.
nessa semana em que todos nos lembramos dos pedacos que nao estao mais por perto, estivemos mais perto do que nunca. conversamos, lembramos, contamos uns aos outros historias de ontem - planejamos pro futuro. eu tenho sim, muita feh de que eles olham por nos de onde estao. acredito, sim, que eles estao juntos, que nos guiam, que iluminam nosso caminho.
parte da minha coragem de viver vem da consciencia de que, aconteca o que acontecer, decida eu o que decidir da minha vida, eles vao estar lah. posso estar aqui ou aih, tanto faz e nao importa.

do que vou sentir saudade



essa aqui eh a trilha do winnekenni park, onde eu vou correr quando a chuva permite. onde a musica que sai do meu ipod me leva pra alem desse caminho.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

a caixa

faz um tempo jah que eu inventei as caixas nos aniversarios da lenoca, inesuca e danielzinho. era uma forma de me fazer presente mesmo tao longe, de mostrar pra eles o quanto lhes quero bem e de diminuir essa distancia grande e ingrata que nos separa. alem da curticao dos telefonemas depois, de falar de cada uma das bugingangas que vao dentro da caixa, tem ainda as fotos que o danico tira e me manda, pr'eu ficar aqui babando nas belezocas se esbaldando com a caixa que a tia mari mandou.
e eh incrivel como eles percebem o recado! ontem, a pituquinha antes de dormir, juntando as bugingangas da caixa que ainda estavam sobre a cama, falou assim pra mae:
- mae, a tia mari eh uma amigona. ela soh pensa na gente, nao pensa em mais nada nesse mundo, soh na gente.
soh mesmo as criancas pra tanta percepcao e tanta simplicidade!

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

quando a inspiracao nao me guia as maos...

Passagem da Noite

E' noite. Sinto que e' noite
nao porque a sombra descesse
(bem me importa a face negra)
mas dentro de mim,
no fundo de mim, o grito
se calou, fez-se desanimo
Sinto que nos somos noite,
que palpitamos no escuro
e em noite nos dissolvemos.
Sinto que e' noite no vento,
noite nas aguas, na pedra.
E que adianta uma lampada?
E que adianta uma voz?
E' noite no meu amigo.
E' noite no submarino.
E' noite na roca grande.
E' noite, nao e' morte, e' noite
de sono espesso e sem praia.
Nao e' dor, nem paz, e' noite,
e' perfeitamente a noite.

Mas salve, olhar de alegria!
E salve, dia que surge!
Os corpos saltam do sono,
o mundo se recompoe.
Que gozo na bicicleta!

Existir: seja como for.
A fraterna entrega do pao.
Amar: mesmo nas cancoes.
De novo andar: as distancias,
as cores, posse das ruas.
Tudo o que a noite perdemor
se nos confia outra vez.
Obrigado, coisas fieis!
Saber que ainda ha florestas,
sinos, palavras; que a terra
prossegue seu giro, e o tempo
nao murchou; nao nos diluimos.
Chupar o gosto do dia!
Clara manha, obrigado,
o essencial e' viver!

Carlos Drummond de Andrade
faz dias jah que eu busco uma inspiracao pra escrever, mas a verdade eh que nao ha inspiracao pra esses ultimos dias. hoje eh dia 31 de agosto, dia que precede setembro, um mes que eh dificil ver chegar. setembro mudou nossa vida, entre 2005 and 2006 - primeiro numa perda esperada, embora dificil, e que seguia a ordem mais natural das coisas. depois numa perda nao esperada, sem ordem, sem nexo, sem sentido qualquer. aos trancos e barrancos, vamos todos nos aprendendo a viver com as ausencias, com a saudade, com os buracos que permeiam nossos encontros. ha pouco o que dizer. e, na verdade, a gente fala mais nos abracos, nos telefonemas, nos pensamentos de todos nos juntos. setembro eh mes de sentir saudade...

ainda assim, a vida segue. do mesmo jeito que setembro nos levou, setembro nos trouxe: dia 3 faz aniversario a pituca, dia 19: minha mae e dia 27: o bilotinho, meu afilhado.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

o jonas, meu primo, me escreveu hoje dizendo que aprendeu com o vovo firmino que o que tem que ser tem muita forca. essas palavras ressoam no meu cerebro desde a hora em que as li. palavras de tranquilidade, feh e esperanca.
nao, nao existe mesmo coincidencia. o universo conspira. e eh totalmente a favor.

pelo mundo

"um homem precisa viajar por sua conta, nao por meio de historias, imagens, livros ou TV. precisa viajar por si, com seus olhos e pes, pra entender o que eh seu, para, um dia, plantar suas proprias arvores e dar-lhes valor. conhecer o frio para desfrutar o calor, e o oposto. sentir a distancia e o desabrigo pra estar bem sob o proprio teto.
um homem precisa viajar pra lugares que nao conhece pra quebrar essa arrogancia que nos faz ver o mundo como o imaginamos e nao como simplesmente eh ou como pode ser."
amir klink

somos doze netos estradeiros, jah dizia minha avoh. gostamos todos nos de bater perna por aih, por pouco ou muito tempo, todos jah saimos de casa, estivemos por aih. gostamos do mundo. nesses dias em que volto meu pensamento pro lugar de onde venho, tenho pensado no valor dessas experiencias, no que isso significa em minha vida, no que mudou em mim depois de tantos anos longe de casa, dos meus. e comparado ao que vejo nos que nunca sairam do proprio canto, na diferenca das conversas, da largura dos horizontes. esses anos longe nao me fazem melhor nem pior que ninguem, mas me deram mais material pra entender o mundo, entender pessoas diferentes, de habitos diferentes, sem gastar tanta energia estranhando ou questionando aquilo que eh diferente simplesmente porque eh. nao precisar encontrar o bom ou o ruim no diferente e, sobretudo, aprender a conviver com e ateh a adotar algo do diferente que lhe cabe eh libertador.
aprender a viver no mundo, aprender a se virar, aprender que o que eh importante pra voce e pros seus pode ser totalmente insignficante pra alguem de outro canto do mundo faz com que voce entenda mais aquilo que ve no canto do mundo de onde vem. tudo o que vivi, primeiro saindo do nordeste rumo ao sudeste e depois mudando de pais, me fez entender que o que chamo de casa pode ser varios lugares. posso ser feliz aqui, em fortaleza, em salvador, em vicosa, em halifax, em paris ou em merida. posso encontrar casa em todos esses lugares, posso fazer amigos, construir ligacoes solidas e duradouras. e nao, nunca devo esquecer quem eu sou, de onde venho, de quem venho.
acumular essas experiencias soh me faz ser mais quem eu sou, saber mais de onde venho. andar esses caminhos me prepara pra voltar pro lugar de onde eu venho, viver mais uma vez junto aos meus. jah posso comecar a plantas minhas arvores.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

por email, chegou a previsao. num dia de sol da quase primavera do rio, ela me fala da alegria dos dias de calor no tropico, fala de felicidade, preve que eu vou ser feliz. nao, nao: nao tenho muitas ilusoes a respeito de tudo - vai ser dificil, a adaptacao vai ser um processo lento e, por vezes, doloroso. vao haver, sim, aqueles momentos em que eu vou maldizer, falar que nao valeu, pedir pra voltar. vou sentir saudade, vou mesmo fraquejar. mas nao consigo conceber ficar parada no tempo e no espaco por medo de seguir. e esses hao de ser soh momentos, pedacos, que completam o todo.
e eu sei bem qual eh o todo - nomeio seus componentes um por um de noite antes de dormir, quando peco a quem pode mais que eu que os guarde, que os guie, que os ilumine. que nao lhes deixe faltar forca pra seguir em frente, porque assim tambem eu nao perco o rumo - minha forca vem deles.

em tempo: o verao do norte do continente americano chegou aos 45 minutos de segundo tempo, com gosto de nem chegou e jah vai embora e, em dias como hoje, abafados e turvos, tem cara de jah vai tarde.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

porque eu nao tenho medo de estagnar no tempo, morrer de parada historica (*), embotar, encruar, involuir. porque mesmo quando eu passo por momentos dificeis, mesmo quando me sinto soh e parece que os meus, aqueles que sao mais meus, estao longe - nao no sentido geografico - nao perco a vontade de viver, a forca de seguir, a gana de buscar mais. porque mesmo quando eu estou mais cansada, tao cansada que me doem todos os musculos do corpo, ainda nesse momento tenho energia, forca, sonhos que nao sossegam nunca e estao sempre perambulando no meu pensamento. porque mesmo nos dias mais escuros e no verao menos ensolarado e mais chuvoso da nova inglaterra, eu acho um motivo pra me levantar, vencer a inercia nunca eh um problema pra mim. problema pra mim eh conseguir parar, me aquietar, nao pensar nada, nao ter mil e uma coisas ao mesmo tempo desfilando pela minha cabeca.

sexta-feira passada, fui no salao e avisei pra elizabeth: sim, vou cortar o cabelo e vai ser bem curtinho. eu queria algo moderno, que tivesse cara de corte novo, que ficasse diferente de todo mundo que anda por aih com os cabelos iguais a alguma celebridade que eu, propositadamente, ignoro. e foi isso mesmo que a elizabeth fez. nao, eu nao tenho medo de mudar - mesmo sabendo que mudancas me custam energia e podem trazer sofrimento. desde a mudanca do corte de cabelo ateh a mudanca maior, mais radical que afeta a vida.

* morrer de parada historica: expressao da tia marly, pra se referir aqueles que vivem do e no passado.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

celebrar:

- a agencia nacional de saude e sua notificacao magica, que fez o plano de saude voltar atras e cobrir a cirurgia.
- a cunhada, dona do senso de cidadania, que sempre se reporta as agencias reguladoras, pra que as coisas funcionem do jeito que tem que funcionar e que inspirou a ideia de envolver a agencia nacional de saude nessa historia.
- o irmao que foi pra salvador e tomou a redea em suas maos, mandou e-mail, falou com o medico, fucou daqui, dali, e conseguiu.
- as minhas primas, e a nossa relacao proxima, mas leve, baseada no amor, na compreensao. elas sempre sabem quando eu preciso d'um afago, um telefonema.
- o cumpadre, a comadre e as muitas vezes que eles me ligam pra conversar, as vezes tarde da noite, mortos de sono, soh pra me dar um beijo.
- a pipoquinha, menina de personalidade e coragem, que do alto dos seus sete aninhos, pediu a mae pra cortar o cabelo curto, e, mesmo com as criticas das coleguinhas, estah feliz da vida de visual novo.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

cabimento

quando eu crescer, quero ter uma casa bem grande. nao assim grande nos metros quadrados, mas grande no que ela engloba, abarca, acomoda, ajeita. grande que caiba meus grandes amores, minha intensidade, minha vontade de viver, minha musica, meus barulhos todos, meus pinotes pra lah e pra cah. que acomode quem quiser chegar, se juntar. pra onde todos saibam que podem ir - eh soh ir chegando, que cabe.
que tenha uma mesa bem grande na cozinha, que esse seja o canto onde todos se reunam. e quando todo mundo estiver sentado partilhando sabores, algo mais seja dividido. se sentar pra comer ha de ser soh a desculpa pra todo mundo passar um tempo junto. nao tempo pro-forma, soh pra ingles ver. mas tempo de verdade, em quantidade e qualidade.
e que, mesmo naquela imensidao de pessoas e sentimentos, que nela eu nunca me sinta soh.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

pra mila

ela espalha pelo mundo a beleza. que vai alem da beleza fisica, dos olhos castanhos, da boca carnuda, da altura. vem atraves dos olhos a beleza dela, porque vem de dentro, eh inerente, intrinseca.

ela espalha pelo mundo a docura, quando abraca apertado e se entrega ao abraco, quando pousa a mao na gente ao sentar do lado pr'uma conversa, quando escuta atentamente as historias de sempre. mesmo quando ela perde a paciencia e se irrita e desfere palavras cortantes, ainda assim, tao humana, ela eh doce.

ela espalha pelo mundo a generosidade, de quem de fato dah valor ao outro, que entende, que apoia, que se faz sempre presente, que eh capaz de pegar um aviao soh mesmo pra ficar perto uns poucos dias.

amanha, quando receber os parabens ao telefone, ela vai continuar espalhando pelo mundo esse monte de coisa boa que soh ela sabe espalhar. desde quando a gente dividia um quarto na casa da rua das dalias e a nossa vida comecava a se misturar. desde sempre, o tempo todo.

sem ela, nao ha nada, nao ha sentido, nao ha rumo, nao tem porque. sem ela nao tenho um pedaco, sem ela nao sei viver.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

ii. anatomia de uma decisao

o universo parece mesmo conspirar, e eu tenho certeza absoluta de que nao ha nada de coincidencia nisso.
minha voh foi internada, depois de sentir dores no peito. mamae, como de costume, esperava a historia se resolver pra soh entao me contar. o problema eh que depois ela esquece, como quando a tia zenaide morreu e ela deixou pra me contar depois e acabou esquecendo. vim saber mais de um mes depois, assim por acaso, no meio de uma outra historia, na qual a tia zenaide era soh uma coadjuvante. e o susto foi grande, mais do precisava ser. minha sorte eh que tenho a mila e o dani, que nao me escondem. o universo conspira junto com minha agonia por noticias, eh enfarto? nao eh? o que foi, afinal de contas?
voltou a chover ontem, nesse julho que nao parece verao. mais da metade do curto verao da nova inglaterra jah se foi, quase todo num tema soh: chuva e temperatura abaixo da media. nem o 4 de julho, tradicional dia de sol, de cook-outs, de gente brincando ao ar livre e fogos de artificio escapou esse ano. o universo conspira junto com a chuva.
meus alunos nesse semestre de verao sao letargicos, apaticos. me pego as vezes no meio da aula olhando pr'aquele bando de jovens, todos bem nutridos, mas tao sem energia pra vida. mesmo que voce nao goste da materia, mesmo que voce soh esteja fazendo a disciplina pra cumprir tabela, voce estah ali, obrigatoriamente, um certo numero de horas por semana - nao seria mais inteligente aproveitar o tempo ali? nem que seja pra nao ficar entediado horas a fio durante todo o semestre? o universo conspira junto com meus alunos.
em compensacao, o telefone aqui de casa toca. os emails chegam. e, mesmo que tao longe, estou perto.

terça-feira, 21 de julho de 2009

caminho

algumas coisas nao merecem a energia que a gente despende pra resolve-las. eh melhor mesmo soh deixa-las ser, pro tempo mostrar qual eh mesmo o caminho a ser seguido. lutar, espernear, fazer muito rebulico as vezes soh drena energia preciosa pro futuro, quando a hora da acao de verdade chegar.
enquanto espero a hora de usar minha energia, vou aproveitando os escassos dias de sol no verao da nova inglaterra. o sol que veio pra secar a lama das trilhas do winnekeni park, onde vou dar minhas corridas, onde as pessoas se cumprimentam, onde o cara que, com certeza, seria o melhor amigo do forest gump me pergunta todo dia que musica estou ouvindo e cuja cadelinha border collie corre comigo por alguns passos. mas a magica mesmo acontece na hora em que, sozinha nas trilhas, permito que elas me levem pra onde vai meu pensamento. naquelas horas, somos soh eu, a musica e o caminho.
ao contrario dos ultimos dias, que foram de sol e calor, hoje amanheceu chovendo. chuvinha fina, dessas que vem pra lavar o mundo. e tambem ao contrario do que vinha acontecendo, nao esquentei o juizo. fiquei em casa pra trabalhar, fiz um almoco bem gostoso e, quando acabar o que tenho pra fazer, vou continuar lendo meu livro, sentada no sofa da sala, perto das flores amarelas que fazem minha primaver particular, de pijama, que eu gosto mesmo eh de ficar de pijama em casa. em minha casa hoje, seremos eu, meus discos, meus livros, meu crochet e nada mais.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

entre as estrelas e o chao

o melhor momento da semana foi ontem, na horinha mesma em que a moca da agencia me ligou pra avisar que minha passagem pro brasil no fim do ano estah confirmada. vou ficar quase um mes inteirinho em fortaleza.
o segundo melhor foi hoje, apesar da quase ausencia do sol, fui correr no parque. ainda nao tinha conseguido ir correr no parque esse verao. muita chuva deixa as trilhas muito enlameadas e nao dah pra correr. ainda tinha um pouco de lama, mas dava pra passar. foi bom.

"...vao descobrir que entre as estrelas e o chao existe o mar..." - Marcelo Camelo

domingo, 12 de julho de 2009

ela disse: pai, queria morar em new hampshire, pra estar sempre pertinho da tia mari. e o pai: quando a gente tah com saudade e tah longe, a gente pega o telefone e liga pra pessoa e aih a saudade passa. e foi assim que, ontem no fim da tarde, toca o telefone aqui de casa e eu ouvi o oi, tia mari que sempre faz tudo a minha volta ficar bom. quando penso que ela mal tinha dois anos quando saiu de perto, que depois que eles se mudaram a gente soh se ve nas ferias e que, ainda assim, o elo eh tao forte, entendo que sabemos mesmo muito pouco sobre o poder do amor, que a gente vive, assim sem mais nem menos, a subestimar.
nao sei porque ainda me surpreendo com o poder do amor, se eh ele que me guia, me sustenta e socorre quando penso que nao tem sentido, que nao dah pra viver assim, que estou soh no mundo. ele vem em formas variadas, por meio de emails, telefonemas, posts, comentarios, telepatia. em muitos casos, ele vem junto com o sangue, a genetica e sua forca a nos fazer querer bem aqueles que tem uma porcentagem, por pequena que seja, dos nossos genes. e em outras, a me mostrar que nem tudo na vida eh ciencia nem requer analise estatistica, ele vem sem sangue mesmo, sem nenhum gene em comum, mas vem e eh isso que importa.
ainda vou me sentir soh mais vezes. ainda vou pensar por alguns momentos que nada faz sentido, ainda vou sofrer com dias frios e nublados no julho que deveria ser quente e ensolarado. mas sei que alguma mao vai se estender na minha direcao, alguem vai me mandar um email, alguem vai dizer que tem saudade e alguem vai ficar genuinamente feliz por ter sido acordado no domingo de manha e conversar mais do que deveria e chegar atrasado no almoco da familia.
a voces todos, que me estenderam a mao, minha gratidao sempre. voces fazem tudo ter sentido. a agua que passa em baixo da ponte vai, aos poucos, mudando de composicao, de textura, de cor.

ps: sexta e sabado, fez sol. e nao foi coincidencia. aproveito e aviso aos navegantes: assim com a reka, to riscando a palavra coincidencia do meu dicionario.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

fragmentado

a agua que passa embaixo da ponte eh sempre a mesma, o seu eterno serpentear por entre as pedras, a cor amarelada, o ferro dissolvido das pedras em que tanto bate a agua, que passa. como tudo na vida: passa. oxala essa agua mude de cor, oxala outros minerais aparecam, modifiquem-se a composicao, a textura, a cor e tudo mais. assim, talvez o ar de quem passa pela ponte e inspira o vapor que o calor traz para atmosfera se renove e tudo volte, mais uma vez, a fazer sentido.

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dizem por aih, e eu comeco a crer que eh de fato verdade: o universo conspira. ainda nao consegui perceber se contra ou ao meu favor, mas, sim, o universo conspira. a nova inglaterra estah tendo em 2009, um dos veroes mais atipicos. cheguei aqui, de volta do brasil, por volta do dia 10 de junho e ateh o dia 30, so haviamos tido quatro dias de sol. julho comecou e jah quase um terco completo, soh nos deus mais dois dias de sol. chuva eh bom, ruim eh o escuro constante.

domingo, 5 de julho de 2009

i. anatomia de uma decisao

sinto-me soh, hoje, quando todos que estao fisicamente ao meu redor estao ocupados com algo que nao me diz respeito. pergunto a mim mesma: quantas vezes isso jah aconteceu e nao me incomodou? hoje, incomoda. incomodarah no futuro ou vai passar? se alguem aih souber a resposta, me avisa.
fazem-me companhia, nesse domingo pos-4dejulho, o crochet e dois livros: um que se passa na irlanda, uma linda historia sobre as vivencias de um medico em comeco de carreira indo trabalhar como clinico geral numa vilazinha perto de belfast; e outro, presente da rita no ultimo dois de junho. alem do dani que, como sempre, me liga, sem nem saber que eu estou soh.
no livro que a rita me deu, carlos drummond de andrade diz:

Noticias

Entre mim e os mortos ha o mar
e os telegramas.
Ha anos que nenhum navio parte
nem chega. Mas sempre os telegramas
frios, duros, sem conforto.

Na praia, e sem poder sair.
Volto, os telegramas vem comigo.
Nao se calam, a casa eh pequena
pra um homem e tantas noticias.

Vejo-te no escuro, cidade enigmatica.
Chamas com urgencia, estou paralisado.
De ti pra mim, apelos,
de mim pra ti, silencio.
Mas no escuro nos visitamos.

Escuto voces todos, irmaos sombrios.
No pao, no couro, na superficie
macia das coisas sem raiva,
sinto vozes amigas, recados
furtivos, mensagens em codigo.

Os telegramas vieram no vento.
Quanto sertao, quanta renuncia atravessaram!
Todo homem sozinho devia fazer uma canoa
e remar pra onde os telegramas estao chamando.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

tempo, tempo, tempo, tempo

"tempo, tempo, mano velho
falta um tanto ainda, eu sei, pra voce correr macio..."

hoje, pensando na vida, buscando inspiracao pro dia, me dei conta de que usei muito as expressao "o tempo eh um senhor poderoso" nos ultimos dias. tenho brincado com o tempo, jogado com ele, porque ele eh, de fato, um senhor muito poderoso. uma das grandes descobertas da minha vida foi aprender a utilizar o tempo, que cura muitos males, que dah a milhagem pra que nos acostumemos com o inimaginavel, o mais supreendente, o mais doloroso, a maior das rupturas, o mais drastico dos desvios.

demorei muito pra aprender a lidar com o tempo. e sofri muito com a ansiedade da adolescencia, com o arrastar do tempo que nao passa ou com a pressa do tempo que passa rapido demais. hoje nao, as licoes aprendidas me fizeram ter a calma necessaria pra entender que posso, sim, brincar com o tempo, e mais que deixa-lo me levar, eu posso jogar com ele, leva-lo comigo e utilizar seu poder ao favor do meu bem-estar. hoje, mais que me angustiar, o tempo me inspira. e foi o tempo que me ajudou nesses ultimos dias em que me isolei, pra deixar o tempo, sozinho, cumprir o seu papel. saio desses dias com a cabeca mais tranquila, o espirito em paz.

os meus disseram: pense, o que voce decidir, estah decidido - estamos aqui pra apoia-la. eh muito confortante ouvir isso e saber que nada nas minhas escolhas, por mais duras que elas sejam, modificarah o que construimos. eu sei disso: aqui ou lah, vou continuar fazendo parte. mas essa liberdade de escolhas me faz ficar ainda com mais vontade de ir. talvez, se eles fizessem pressao, se me pegassem no peh, eu soh de pirraca mudasse o rumo da prosa. nos nao somos uma familia tipica em varios sentidos. nos somos extremamente proximos e nos amamos muito, mas sabemos preservar o espaco que eh de cada um. por isso, entre tantas outras coisas, eh tao bom fazer parte.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

carrossel

no rockingham mall, em salem, new hampshire, sento-me e observo a vida, que passa ao meu redor. um senhor, os cabelos brancos jah, sobe no carrossel e procura junto com uma menininha um cavalo. acham o cavalo, ele a ajuda a subir, ajeita-lhe o cinto de seguranca. o carrossel emite um som, vai comecar. e eh soh a musica soar e o cavalo comecar a subir e descer pra que ela, a menininha, se abra num sorriso. e que ele, o senhor dos cabelos brancos, sorria com o rosto inteiro. olhos, testa, boca, tudo sorrindo no rosto cheio de rugas, tantas marcas de tempo. ele deve viver pr'aquele sorriso, pensei. aquela alegria compartilhada entre os dois a me mostrar que a gente precisa mesmo eh de muito pouco pra ser feliz. que um sorriso espontaneo, dado ao som da musica e do balanco de um carrossel mequetrefe vale mesmo mais do que grandes momentos, grandes realizacoes. meu avo tinha toda razao quando dizia que a felicidade de verdade eh a pequena, do dia-a-dia.

terça-feira, 23 de junho de 2009

ha muitos dias, uma ideia nasceu dentro de mim. eh soh empolgacao, pensei. nao dei bola, fiz alguns comentarios com pessoas, mas ateh pra mim mesma era dificil imaginar a dita ideia como uma ideia forte, definitiva, duradoura. pensava que, ao retornar pra minha rotina, pra minha vida de todo dia de que eu gosto tanto, o mundo todo voltava pro lugar de onde nao deveria nunca sair, sem ideias subversivas a me corroer as entranhas. nao aconteceu conforme o planejado, mostrando-me mais uma vez que eu tenho soh a ilusao do controle.
tenho aprendido, a penas as vezes muito duras, que a vida eh curta demais. que ha muito mais entre o ceu e a terra do que sonha a minha va filosofia, eu jah sei faz tempo. mas isso nunca foi tao real como agora. e assim a ideia nasceu, cresceu, ganhou corpo e forma e tem ocupado todos os espacos vazios e mais alguns nao tao vazios assim. pensei outro dia na ideia e quase perdi o fio da meada da aula... nao tem biologia que segure minha mente quando ela vai a mil por hora.
pra alguem, como eu, que gosta de tudo no seu devido lugar, que gosta (ateh demais) de manter o controle da situacao, esses ultimos dias tem sido dificeis. o sol nasce e vai embora no lado oposto do horizonte e nao acho uma resposta definitiva pra essa pergunta.
soh mesmo a minha feh de que tudo vai chegar no seu devido lugar ao seu tempo pra me sustentar. afinal de contas, como minha mae repete desde que eu me entendo por gente: nao ha nada como um dia apos o outro.
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recebi, ainda agora, um email falando de saudade, de amor, de vontade de sentar na beira-mar e conversar... no polivalente, muita saudade e o significado de 'familia' expresso em palavras bem escolhidas e com uma clareza dificil de comparar. eh, soh familia diz certas coisas. eh esse amor todo que transita entre nos que me segura.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

linhagem

eu descendo de mulheres fortes. tao fortes que, as vezes, sao duras demais e me assustam. mas gosto, me orgulho de ter em mim tracos daquelas mulheres de forca, de coragem, de decisoes surpreendentes. muitas delas conseguem ser fortes com uma docura imensa, o que me faz admira-las ainda mais. nao tenho essa docura toda em mim, sou peh-no-chao demais, franca demais, objetiva demais.
vinda dessa linhagem, minha geracao se constituiu tambem com mulheres fortes. nossos tracos se mostraram com clareza enorme desde muito cedo, dava pra ver nas brincadeiras e nas brigas da infancia, deu pra ver na rebeldia da adolescencia, da pra ver claramente hoje, que somos todas adultas. sou feliz por pertencer a esse time de mulheres de genio forte e opinioes definidas, que, no meio de tantos superlativos, conseguem se amar e se respeitar.
tenho pensado muito na minha familia. na heranca e no legado dos meus antepassados, sobretudo nas mulheres que nasceram antes de mim. minha vida familiar foi marcada pela distancia: minha mae saiu de perto pra se afirmar como individuo e nunca mais voltou. eu - que nunca tive problemas em me afirmar, perto ou longe, sou eu mesma - ironicamente tambem sai de perto. agora, sinto vontade de voltar pro ninho. quero a convivencia com seus problemas, com o peso que isso pode trazer, mas tambem com a leveza que isso tem.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

to chegando

aqui ainda eh casa. to chegando devagar, depois de tres semanas e muita coisa vivida, pensada, vista. aqui nao tem ninguem pra colocar mais agua no feijao porque eu to chegando, nao tem rostos risonhos me esperando no aeroporto. o oficial da alfandega diz: welcome home, ma'am. e eh bom, como sempre, ouvir isso. aqui, nao importa o que aconteca, vai ser sempre a minha casa - tambem.
mas me faltam alguns pedacos aqui. esses pedacos faltantes me pesam agora no equilibrio deslocado, que faz o corpo pender pro lado, penso em cair, paro, respiro. sigo em frente. a frase que me vem a mente me diz assim que tudo tem o seu tempo certo, que, de alguma forma tudo vai chegar no seu lugar devido. ninguem nunca morreu de pedaco faltante, eu certamente nao serei a primeira.
o peso dos pedacos que ficaram ao sul da linha do equador, que de uma hora pra outra cresceu de escala, me faz enxergar que eh hora de parar pra pensar no que pode estar por vir. eh preciso tomar um decisao quanto ao rumo, mesmo que seja pra decidir que nao devo mudar o rumo. de alguma forma, tudo vai mesmo chegar no seu devido lugar. esse barco, algum dia, ha de aportar em algum lugar seguro.
boston me recebeu nesse quase meio de junho com chuva, 14 graus e o seu peculiar vento frio. no onibus pra rodoviaria onde esteve estacionado o meu carro nos ultimos 20 e poucos dias, olho ao meu redor e eh tudo diferente. ainda assim, to chegando.

terça-feira, 19 de maio de 2009

vou dar a volta no mundo

e volto jah!
nas minas gerais, marly prepara a melhor canjiquinha, a melhor feijoada, o melhor arroz com sua (tem til no "a", mas meu teclado nao permite...), a melhor vaca atolada, o melhor de tudo em culinaria mineira. poucos sao os que cozinham como marly cozinha. poucas sao as cervejas tao geladas como a que marly cuidadosamente arruma na geladeira, na hora certa, pra ela ficar no ponto. mas nem de longe isso eh o melhor. o melhor daquela casa, encravada num belo vale mineiro, eh a forca de marly, que agrega todos ao seu redor, com todas as maluquices que lhes sao tao peculiares, com todo aquele amor, que nos envolve a todos, aquece o ambiente. vou ouvir a risada dela a preencher os espacos todos, eh ela que vai me acordar de manha, o pao de queijo no forno, o cafe passadinho, com meu pingo de leite, que ela sabe direitinho do que eu gosto. de noite, nos vamos sentar perto do forno no frio brando do outono das gerais, e vamos ouvir musica e cantar, falar de guimaraes rosa, adelia prado, drummond. ali bem naquela casa, tenho uma familia, a despeito da ausencia dos genes comuns. ali, mais que padrinho e madrinha, tenho um pai, uma mae. ali construi, forjei raizes.
depois tem fortaleza. onde o sol brilha quente mesmo quando chove. onde pequenos me chamam de tia mari, de dindinha, pra me fazer viver de alegria. onde dona zelinda completa 90 anos, com os olhos mais transparentes que eu jah vi na vida. onde eu sou neta, sou filha, sou irma. fortaleza eh porto, onde atraco meu barco pra recuperar forcas. pra passar a tarde inteira na casa da rita - ali naquele apartamento do papicu, onde o vento corre livre do mar ateh o parque do cocoh, tambem tenho uma familia, faco parte. pra passar dias preciosos na fazenda logradouro, na quixada dos monolitos - ali tambem faco parte. fortaleza eh ponto de partida, eh meu norte, embora eu tenha sentido cedo que ali nao pararia. de fortaleza, parto pro mundo. ali, estao raizes, essencia, origem - estar lah reforca em mim o que sou, quem eu sou. fortaleza eh necessidade.
antes de voltar pro canto do mundo que eu escolhi chamar de casa, ainda paro em brasilia, pra completar o brasil dos meus amores. poderia viver sem a terra, sem os cheiros, sem as comidas, sem os sons... gosto disso tudo, mas isso raramente me faz falta. o que me faz falta de verdade sao os meus amores; eh pra eles, e por eles, que eu viajo.

terça-feira, 12 de maio de 2009

ando piegas, sentimental, touchy-feely. minhas musicas preferidas tem sido boleros... maria bethania cantando roberto carlos tambem tem estado no topo da minha parada de sucesso! me emocionei outro dia ouvindo ela cantar 'outra vez', quase borrei o rimmel do olho indo pro trabalho logo de manha cedo. nunca mais ouvi o noticiario da npr - as favas com a guerra do iraque, o preco dos imoveis e a reforma do sistema de saude! ando querendo mais ouvir musica, cantar junto e me emocionar. minha familia, a de sangue e a que escolhi ao longo do caminho da vida, me cerca de amor, de cuidados e atencoes. minha colecao de sobrinhos cresce - como titi mari ou tia mari, eu me realizo . essa semana, ganhei mais uma sobrinha. essa vai se chamar mariana como eu e, nem nasceu, jah me enche de felicidade. brusk, vc tem toda razao quando diz que sobrinho eh uma coisa sem explicacao.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

amor por correspondencia

e-mail numero 1:
TUDU BEM TIA MARI? EU NAO CONCIGO ESPERAR ATE VOCE VINHER PARA CA. NOIS VAMOS SE DIVERTIR MUITO. VOCE LEMBRA DA LITTLE MOMMY? ESTOU SETINDO MUITA SALDADE DE VOCE. TE AMO MUITO.

e-mail numero 2:
Tia Mari, eu te amo. Eu nunca vou te esquecer.Eu sempre quero você aqui, mas eu ainda vou nunca te esquecer porque eu sempre vou te amar. E também eu te amo muito. E você tá sempre no meu coração. E todo dia eu sempre levanto da cama e vou direto para lembrar de você.Tia Mari, eu brinquei muito mas também eu brinquei lembrando de você porque todo dia eu lembro de você. E eu nunca vou no pátio sem você no meu coração porque eu se diverti muito e também eu fiquei com muitas coisas mais com você e eu aqui nessa semana. Porque eu não vou ir passear sem você. E eu sempre quero você aqui pertinho de mim. E também eu amo muito você e eu já fui muitas vezes com a mamãe e o papai no trampolim do Náutico. É muito divertido. Eu brinquei muito. Eu tenho muitos amigos, menos você. E eu nunca quero você longe de mim.Tia Mari, eu também sei muitas coisa mais. Porque eu nunca vou pro carnaval sem você pertinho de mim.Um beijo, tchau tia Mari. Eu te vejo na outra semana.

quando elas foram embora daqui, me disseram: elas sao tao pequenas, vao esquecer de voce depois de algum tempo. e me olharam com um olhar de pena, depois da sentenca declarada. como se jah nao bastasse eu lidar com a mudanca deles, a consequente mudanca na minha vida, a saudade, a falta. nunca disse nada a ninguem, mas confiava secretamente no laco de amor que nos unia entao, que nos une hoje, que ultrapassa barreiras, logica, que nao cabe em palavras. aih estao os emails: da vontade espontanea da mais velha, que, com saudade, escreve ela propria uma mensagem pra tia mari. erros de portugues mais lindos, a saudade, a ansiedade do reencontro que se aproxima. e do ciume da pequena, que tambem quer escrever pra tia mari, que dita pro pai a mensagem do seu proprio jeito.
a tia mari vai dormir feliz, cercada pelo amor das pequenas, sonhando com os abracos de maio, com a mistura de amor, boneca little mommy, saudade e o trampolim do nautico!

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Cantiga triste

Toada
Cantiga triste, pode com ela
eh quem nao perdeu a alegria
Adelia Prado

tem um primavera todinha desabrochando ao meu redor. os daffodils, minhas flores preferidas, jah estao ficando com cara de velhos, sinal de que a primavera jah se instalou faz tempo. jah tem tulipas, tem flores de todas as cores cobrindo a copa de todas as arvores. tem abelhas, moscas, besouros. faz dias que uma joaninha caminha pra lah e pra cah na minha janela.
apesar desse explodir da vida ao meu redor, apesar de tantas cores, apesar do verde que volta depois do inverno quase monocromatico, nao tenho tido olhos pra apreciar, nem espirito pra seguir. andei cantando cantiga triste, meus ultimos escritos foram todos tristes, meus pensamentos vinham numa nuvem cinza escuro, a rondar minha cabeca e me impedir de ver o sol.
eu posso com isso. porque pertenco a estirpe dos que nao perdem a alegria. e, por isso, posso me dar ao luxo de cantar cantigas tristes. faz jah algum tempo que aprendi que quando vem tristeza, com ou sem motivo, preciso deixa-la entrar, preciso senti-la. ela vai-se um dia, mais cedo ou mais tarde. tristeza nenhuma faz parte de mim, apesar de carregar algumas dores que nao tem jeito, umas saudades que nao vao passar.
hoje, voltando pra casa, ouvindo maria bethania cantar como soh ela pode uma oracao pra nossa senhora das candeias, fui invadida por uma sensacao de bem-estar. adivinhava o que estava por vir. a mila disse alo ao telefone e, impressionada com o fato de que estava pra me ligar quando o telefone tocou, me deu com a voz doce que soh as irmas conseguem ter, as boas noticias.
aviso aos navegantes: a partir de hoje, canto cantigas alegres novamente!

domingo, 26 de abril de 2009

segundo chico buarque: a saudade doi como um barco, que aos poucos descreve um arco, e evita atracar no cais. peguei emprestadas as palavras do chico, pra dizer que estou com saudade, que penso nos meus todos os dias, que queria mesmo era estar lah e nao aqui. e que soh mesmo o medo de jogar tudo pro alto e me arrepender muito depois me fazem permanecer, continuar, seguir. to chegando em maio, tomara que seja a tempo de aliviar alguma dor.

nao to triste. estou preocupada, eh diferente. estou levando minha vida aqui, por dias alheia a primavera que desenrola rapido bem na minha janela. as flores todas, mais as folhas que brotam e colorem de verde em varios tons o mundo antes cinza e marrom, fazem meus dias mais felizes. dirigindo, andando, passando, por uns poucos segundos quase esqueco que queria estar lah e nao aqui. seria de lascar se, alem de tudo, estivesse frio. nesse ponto, o universo conspirou ao meu favor: pelo menos, eh primavera!

nao ha de ser nada! reafirmo pra mim mesma em pensamento mil vezes ao dia. rezem, mandem energia boa, facam pensamento positivo. eu tambem rezo, mando as energias boas que me restam, faco pensamento positivo.

domingo, 19 de abril de 2009

passagem

do tempo: faz quase um ano, nessa mesma epoca, eu estava a me preparar pra ir a portugal, passar uns dias com o cah e a aninha. e depois pra espanha. mamae hoje me mandou um email com fotos da espanha - ela sabe que a espanha me toca no fundo. na mensagem, ela dizia: a espanha eh infinita! eh mesmo, mae, a espanha eh infinita...
do espaco: eu faria qualquer coisa pra ir pra salvador nos proximos dias. qualquer mesmo. jah mexi aqui e ali, investiguei umas possibilidades. sei que ainda nao eh o momento de tomar uma atitude assim as pressas, com o juizo quente. preciso ter calma e esperar o desenrolar dos fatos. mas se o bicho pegar, aviso aos navegantes: nada me segura no hemisferio norte. ah, seu eu estivesse mais perto...
das estacoes: o mundo ao meu redor estah cheio de daffodils amarelos que me fazem sentir menos peso nos ombros. tao leves e belos os daffodils! tem brotos verdes, vermelhos, arroxeados nas arvores, nos arbustos, as gramas estao verdinhas. a primavera explode de uma hora pra outra.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

doze

nos jah fomos doze. jah brincamos todos juntos, jah brincamos em fracoes, jah brincamos uns contra os outros. jah brigamos por quinze minutos, umas poucas horas, nunca mais que isso. jah passamos ferias na serra, sob as regras rigidas dele, sob a luz e o comando dela, jogando king de noite na mesa redonda da sala. jah tivemos que fazer silencio depois do almoco pra que eles dormissem. jah fugimos pra tomar banho de piscina quando ainda tinha muita comida na barriga. jah encontramos urucum na mata, nos pintamos de indio, sujamos os tenis novos comprados pro ano letivo, levamos bronca. jah arrancamos um pedaco da parede, quase todos na rede, a balancar, balancar, balancar, numa tarde sem fim de aventuras. jah nos perdemos pela vida, nos perdemos uns dos outros. fomos morar em paises do mundo, estivemos longe, passamos meses sem contato. soh havia sempre a certeza: um dia nos reencontrariamos.
ainda somos doze. apesar dos materialistas que nos negam a feh, que nao creem eles mesmos no que estah por vir. nao, nao podemos nos reunir em doze, nosso todo sempre falta um pedaco. nao tiramos mais a foto de todos - nao dah. ainda nos reunimos, ainda brincamos todos juntos, brincamos em fracoes. temos adicoes, nos agregamos. nao passamos ferias na serra em grupos grandes - nao cabemos mais. nos encontramos todos na fazenda, na joatama, sob as regras nao tao rigidas do filho deles, que, de noite, toca violao - cantamos todos - que bebe cachaca com todo mundo, que conta historias, partilha. de dia, nos reunimos ao redor da geracao que nos substituirah um dia: reeditamos as brincadeiras e, como eles fizeram um dia, preparamos o terreno pra que sejam amigos, que se queiram bem como nos, os doze, nos queremos. elas, tambem filhas deles, cuidam de tudo e todos, supervisionam. saimos daqueles dias na fazenda todos mais fortes e partimos, a nos espalhar pelo mundo. no fim, soh ha sempre uma certeza: um dia nos reecontraremos.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

massachusetts

nao. nao gosto quando a minha dignidade, aquela que guia minha vida, determina meus principios e me faz ser quem sou, eh posta em duvida. nao gosto, nao admito que alguem, por qualquer motivo que seja, qualquer mesmo, qualquer umzinho, questione algo que, pra mim, eh tao importante quanto o ar que eu respiro, que me faz escolher caminhos mais longos e tortuosos, as vezes, quando era tao mais tentador e facil escolher o caminho mais curto. ha que se ter cuidado, eu sei: conviccao demais, principios rigidos em excesso, levam a arrogancia. tento todo dia encontrar o meio do caminho, manter minha dignidade, levar minha vida guiada por meus principios e ter alguma flexibilidade. soh isso.
minha reacao fica desproporcional, as vezes. sou humana, viro bicho, ajo por institos, nao por razoes. mesmo que outros e eu mesma cheguemos a conclusao de que nao havia necessidade de tanto, nao se pode mudar o que jah estah feito, pronto e acabado. serve, no minimo, pra explicitar com clareza indiscutivel minha postura.

tenho a sorte de trabalhar numa instituicao feita por pessoas sensiveis. ali, mais que uma equipe de trabalho, somos um grupo de pessoas que querem, de alguma forma, o bem das outras. mesmo que nao exista amizade de fato, nos relacionamos como pessoas que trabalham no mesmo lugar. nao como colegas de trabalho pura e simplesmente. ha, quase sempre, muito respeito. de muitos deles, me tornei de fato amiga. e ouvir uma palavra de amizade e apoio quando um maremoto carrega tudo em torno vale mais que o salario.

hoje, enquanto retirava a placa de new hampshire do meu carro, e trocava pela placa nova, do estado de massachusetts, uma historia antiga me veio a cabeca. eu sempre achei a palavra "massachusetts" linda. adorava a sonoridade e, nas minhas brincadeiras de crianca, eu morava em massachusetts. assim, durante a brincadeira, podia dizer varias vezes massachusetts, massachusetts, massachusetts... o tempo passou, eu esqueci essa historia, me mudei varias vezes. vim parar em massachusetts, pra hoje, trocando a placa do meu carro, recuperar a historinha das profundezas da minha memoria. e a toda hora eu articulo massachusetts, massachusetts, massachusetts...

durante minha falta de criatividade e ausencia, meu blog ficou mais chique. recebo agora comentarios em espanhol. esse blog estah, oficialmente, poliglota!

terça-feira, 7 de abril de 2009

trabalho demais, pouco tempo de ocio sao inimigos da criatividade pra escrever. em tempos de muita necessidade de criar no trabalho, canalizo qualquer potencial de criar pra dar conta do recado. e sumo daqui. volto quando eu parar.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

vida

nao ha nada que ensine mais sobre a vida que conviver com gente. pode ser dificil, exigir paciencia, tolerancia, e milhares de outras qualidade que eu nao tenho. mas, ainda assim, eh gratificante conviver com gente. soh mesmo saindo do meu mundinho onde (quase) tudo acontece conforme o programado, pra entender e aprender sobre a vida. ontem, fui falar com uma aluna minha. muito inteligente, com sacadas brilhantes, ela andou faltando mais aulas que deveria, nao fez varios dos trabalhos. e ouvi ela criar algumas desculpas ateh o momento em que, baixando a guarda, me contou que estah sem teto, que estah vivendo no carro. ali, na hora, na vontade de ajudar, falei dos servicos disponiveis, quem ela deve procurar, o que ela deve fazer. tem shelters na regiao, o college tem um servico de assistencia social, procure eles, eles podem te ajudar; mas nao tive tempo de absorver e refletir sobre a situacao. e fiquei um tempo depois, em casa, com ela na minha cabeca, tentanto me colocar no lugar de alguem que vai dormir e acordar no carro. toma banho? come onde? como serah comer junk food na rua todo dia? ve tv? relaxa? qualquer coisa, qualquer dificuldade que eu ja tenha enfrentado nessa minha vida parece nada perto de algo assim. assim de subito, minha vida em que tudo dah certo, em que ha constancia e consistencia, ganhou uma nova perspectiva.
muitos terao piedade. que pena, pobre coitada! eu, nao. nao quero ter piedade. quero ter forca, quero pode ajudar, fazer algo mais que somente indicar. quero que ela sinta que ha um caminho, que ela pode dar rumos diferentes a vida. quero ser competente e sensivel o suficiente pra contribuir pra que ela tenha auto-estima, auto-confianca e lute, com gana e garra, pra melhorar e mudar o rumo de sua propria vida. quando eu rezar mais tarde, eh essa luz que vou pedir.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Sintonia para pressa
e pressagio
Paulo Leminski
Escrevia no espaco.
Hoje, grafo no tempo,
na pele, na palma, na petala,
luz do momento.
Soo na duvida que separa
o silencia de quem grita
do escandalo que cala,
no tempo, distancia, praca,
que a pausa, asa, leva
para ir do percalco ao espasmo.
Eis a voz, eis o deus, eis a fala,
eis que a luz se acendeu na casa
e nao cabe mais na sala.

tenho feito pouco exercicio fisico. tenho, na verdade, saido pouco de casa. a nao ser que seja trabalho, ando querendo mais eh ficar em casa, curtir esse canto e faze-lo meu. aos poucos, vai ficando com cara de que ali mora uma mariana, que gosta de barulho, de risada, de musica a toda hora, de comida no fogao e de gente. meus amigos tem vindo me visitar, uma alegria a mais nessa casa tao ensolarada. tenho preparado refeicoes pra uma plateia de queridos, que se sentam comigo a mesa e partilham mais que a comida. ali, naquela mesa enfeitada com flores amarelas, meu indez de primavera, a gente partilha a vida e celebra os lacos invisiveis que nos unem. ali, naquela mesa, emily me conta de annie, que cresce a contento dentro do utero, que mexe de noite e nao deixa a mae dormir. ali, naquela mesa, o remi come o resto da salada, pergunta como eu fiz o frango e se oferece pra fazer o upgrade do meu computador. ali, noemi e tita comem moela comigo, preparada como no brasil, enquanto helena corre em volta da mesa, aquela alegria toda de seus 3 aninhos a encher os espacos vazios todos. helena me chama de titi mari, me mata de alegria com abracos inesperados; um beijo e uma mordida. sabe ser charmosa, a helena. sabe o quanto eh querida. me faz sentir falta de noelia, a irma mais velha que estah na escola, que nao pode vir, que inventou essa historia deliciosa de me chamar de titi mari e que, toda vez que me ve, me diz toda feliz que se lembra do nome do meu pai e da minha mae.

na pressa do dia-a-dia, a gente nao ve as pessoas. voce pode ateh olhar, pode ateh notar a presenca, mas eh preciso mais que isso pra ver as pessoas ao redor. hoje, entrando no college, cruzei com a mariluz, ex-aluna; como eu sempre cruzo com ex-alunos e aceno com a cabeca, dou um tchau timido e pronto, sigo apressada. por algum motivo que eu nao sei, parei hoje, chamei-a pelo nome, perguntei pela vida. e ela parou, e me olhando bem nos olhos, me perguntou, entre espanto e surpresa: voce se lembra de mim? me deu um abraco, me contou que entrou no programa que queria. no final, pegou no meu braco, e apertando, me disse: estou feliz que voce ainda se lembra de mim. saih pensando naquele encontro breve, pensando nas muitas vezes que eu poderia ter chamado um aluno meu pelo nome, que poderia ter parado uns trinta segundos pra perguntar da vida e, por um motivo que eu nao sei, nao o fiz.

domingo, 22 de março de 2009

caminhos, caminhar

as vezes, o que escrito estah eh quase ficcao. as vezes, eh quase realidade. quase sempre, eh uma mistura bem dosada entre ficcao e realidade. qualquer coincidencia eh mesmo mera coincidencia. ou nao.


da janela de casa, escuto e vejo o trem que passa, que apita, que solta fumaca e segue o caminho. trilhos, trilhos, trilhos, numa quantidade sem fim de caminhos. ha dias em que me pego tonta, tantos sao eles, estrabica na vida. as encruzilhadas eu vou passando, escolhendo que rumo tomar com ou sem motivo, sem muita confianca na minha intuicao. quando penso que sei, que escolhi certo, uma placa aleatoria aponta pra mim e diz: volte! nem sempre eu volto, nao sou resignada. sou cabeca dura, sou teimosa. a placa me segue caminho afora, apontando o dedo e mostrando-me que eu nao voltei pelo caminho que vim. a vida eh isso mesmo, as vezes eh necessario seguir, a despeito das placas aleatorias, acusatorias, o o que quer que seja.
eu tambem me pergunto porque prossigo, apesar de tudo e qualquer coisa. tambem me pergunto se meus passos sao sempre pra frente. e concluo: sao, sim, pra frente, adiante, pra alem. herdei os olhos verdes da minha avo e, junto com eles, muita forca, garra e um pouco de coragem. eh preciso um vento muito forte pra me derrubar. por causa desses genes fortes, superlativos, qualquer paixao me diverte, qualquer amor me aquece, qualquer cancao me embala.

quarta-feira, 18 de março de 2009

na casa nova, quase jah arrumada a gosto, uma tarde de ócio. boa poesia, boa musica e felicidade entrando pela janela como raios de sol, que entram de um por um, feixes e mais feixes de luz, paz e alegria.
adelia prado habita comigo. eh, de longe, uma das minhas preferidas - presente das minhas minas gerais, terra das montanhas, de marly, de comida gostosa e gente do bem. eu aqui, suspirando de alegria por ter vivido anos muitos nos mares de morros e adelia a sussurrar no meu ouvido:

O amor no éter
Adelia Prado
Há dentro de mim uma paisagem
entre meio-dia e duas horas da tarde.
Aves pernaltas, os bicos mergulhados na agua,
entram e não neste lugar de memoria,
uma lagoa rasa com canicos na margem.
Habito nele, quando os desejos do corpo,
a metafisica, exclamam:
como és bonito!
Quero escavar-te ate' encontrar
onde segregas tanto sentimento.
Pensas em mim, teu meio-riso secreto
atravessa mar e montanha,
me sobressalta em arrepios,
o amor sobre o natural.
O corpo e' leve como a alma,
os minerais voam como borboletas.
Tudo deste lugar
entre meio-dia e duas horas da tarde.

terça-feira, 17 de março de 2009

ontem, 16 de marco, o vovo firmino faria 93 anos. nao gostava de festas, nao queria grandes comemoracoes. mas gostava das ligacoes dos netos que moram longe, gostava de estar com a familia nessas horas. penso sempre nele, as licoes que ele deixou, o exemplo de retidao de carater, de lealdade sao muito fortes e deixaram profundas marcas em mim. esses dias, uma amiga me descrevia como uma pessoa que gosta de fazer tudo certinho, que eh responsavel, que eh perfeccionista. ouvi aquela descricao pensando que quase tudo aquilo eu ou herdei ou aprendi com meu avo diretamente ou indiretamente - atraves da minha mae.

sei que ele hoje estah feliz, porque eh o lancamento do "transatlantico" da mariana marques no teatro jose de alencar em fortaleza. minha maricota. vovo estah alegre junto com ritinha e zezim do limoeiro, estah morto de orgulho da sobrinha-neta danada, que pinta, borda e escreve bonito como quase ninguem consegue:

"no depois, eu vejo a vida como minha mae ve. eu sou do plano da alegria onde corre vento no vao do que mesmo deveria ser mais abafado e escuro.
ainda que eu nao mereca esse transbordar de bencao. ateh a ressaca do mar lavou nossa calcada ontem, um assopro de adivinho e sal. nossas peles umidas se pregando de maresia ainda que sem se tocar, o bem.
e estah tudo limpo.
vejo as luzes das vidas nos predios fazerem a curva na orla. doido eh quem diz que aqui eh o fim do mundo."
mariana marques, em transatlantico

fiquei sentida em nao estar no brasil hoje. do mesmo jeito que fiquei sentida no dia 23 de janeiro de 2008, no dia 22 de abril de 2006 e no dia da formatura do pit, qualquer que tenha sido a data. eu sou dura na queda e aguento o tranco de estar longe dos meus na maior tranquilidade. mas isso nao signifca que seja facil estar longe em datas marcantes, em dias importantes, significativos. fico pensando bem forte nos meus, adivinhando passos ao longo do dia: onde estao agora? jah chegaram no teatro? quem estah lah? que roupa vestem? meu pensamento forte me leva mais perto, eu sei. mas fico o dia inteiro com a impressao de que eu esqueci de fazer alguma coisa importante, ou que esqueci algo valioso demais num lugar onde nao posso mais voltar.
a impressao passa. esse amor todo que flui em todas as direcoes entre nos nao me deixa nao me sentir parte, mesmo estando longe. e eh isso que conta.

segunda-feira, 9 de março de 2009

para flavia, que hoje completa um etapa e fecha um ciclo.
se hoje de manha, na hora em que acordei, alguem me dissesse que eu havia voltado no tempo uns 2 meses, eu acreditaria sem nem piscar os olhos. tinha neve em tudo quanto era canto e continuava caindo. o mundo todo era branco, a luz refletida naquela branquidao sem fim a furar a cortina verde musgo que temporariamente ocupa a janela do meu quarto.
me mudei sabado. dormi aqui pela primeira vez morta (ou viva?) de cansada e de felicidade de ter encontrado um outro lugar pra viver, onde as pessoas levam sua vida com a intencao clara de fazer a dos outros agradavel, pra assim viverem bem tambem. da janela da minha casa, vejo familias que vao passear juntas num dia de sol do fim do inverno, vejo meninos que jogam basquete na garagem de casa, vejo bicicletas cor-de-rosa, meio enterradas na neve que insiste em nao derreter. meu vizinho vem me avisar que viu que minha maquina de lavar nao estava completamente instalada e que tomou a liberdade de terminar o servico. pergunta se tem problema. hein? problema? nao, nenhum - obrigadissima.
tao pouco pr'um contraste tao grande. enquanto eu e o remi arrumavamos as coisas pra comecar a transportar minha mudanca pro caminhao, meus vizinhos antigos nos brindaram com um bate-boca daqueles. pro remi acabar de chegar a conclusao que, de fato, eh hora de sair dali. e me brindar com o gentil comentario de que aquilo nao combina comigo. ainda bem.
*****
flavia hoje defende sua tese de mestrado. e esse post eh pra ela, que me ensina o que sabe, que partilha comigo e alimenta em mim o amor pela educacao. que me inspira com sua luta pela educacao pra todos, no campo, na cidade, no sul ou no norte. e que busca algo que tenha significado, que ultrapasse o tecnico e vah bem fundo, que toque a alma e faca a vida ser plena de significado. foi ela quem me ensinou que educacao tem mais sentido quando se deixa de ser tao formal e se deixa influenciar pela vida daqueles que lhe sao alvo.

domingo, 1 de março de 2009

o sopro

trabalho, trabalho, trabalho. gosto, acredito no meu trabalho. sei que ele eh relevante pra algumas pessoas. mas, eh claro, acordo cansada as vezes. assim foi sexta-feira:
fui na escola de segundo grau de north andover falar sobre a importancia da educacao, da importancia em continuar depois de terminado o segundo grau. falei, falei, falei, citei numeros, estatisticas, contei conversas que tive com minha mae quando mais nova, contei piadas (sim, eu consigo contar piadas quando encarno minha persona professora!!!)... mas nunca nenhuma historia poderia ser mais contundente que aquela que estava pra ser dividida. a dona da historia eh uma senhora de 60 e poucos anos, o cabelo grisalho. nasceu e cresceu em north andover, uma cidade de alguns poucos mil habitates ao norte de boston. nasceu numa familia pobre, o pai nao terminou o segundo grau, a mae terminou a duras penas. foi a primeira filha de muitos (nao lembro exatamente quantos), tinha que trabalhar pra ajudar em casa. mas queria mais: terminou o segundo grau contra a vontade do pai, que a queria logo livre pra trabalhar expediente completo. queria ainda mais: se virou e comecou a estudar no northern essex community college. terminou com muita dificuldade, mas teminou. e aih comecou sua segunda luta: que os irmaos tivessem a mesma oportunidade que ela. bancou quase todos eles durante os anos de faculdade, comprou briga com o pai, com a mae, mas nao mediu esforcos. todos os irmaos se formaram, todos tem uma profissao, todos tem uma vida confortavel e, juntos, propiciaram aos pais, que nao os queriam na escola, uma velhice de conforto e seguranca. todos adotaram seus filhos, porque queriam dividir com outros a chance que tiveram de melhorar nessa vida. nessa hora, nossos olhares se cruzaram e eu tenho certeza que ela viu a emocao nos meus olhos. do mesmo jeito que eu vi naqueles olhos azuis escuros a forca de quem acredita. ninguem jamais conseguiria transmitir aquele recado com a mesma intensidade.
saih de lah energizada, renovada. abri a janela do carro, senti o vento bem frio, me acordando, reiterando minha crenca nesse sopro de vida que eh a educacao. meu cansaco havia ido embora.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

o canto da cidade

pra salvador, onde o mar brilha azul bem escuro
onde o povo danca na rua, ri, canta e beija na boca
que me faz de morrer de saudade todo mes de fevereiro, eu canto:


eh d'oxum
(geronimo)
nessa cidade todo mundo eh d'oxum
homem, menino, menina, mulher
toda essa gente irradia magia
presente na agua doce
presente na agua salgada
e toda cidade brilha
seja tenente ou filho de pescador
gente importante, desembargador
se tah presente eh tudo uma coisa soh
a forca que mora n'agua nao faz distincao de cor
e toda cidade eh d'oxum
eu vou navegar nas ondas do mar, eu vou navegar

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

de um lugar pro outro

to de mudanca. quem quiser saber dos detalhes sordidos e o novo endereco, favor entrar em contato direto com a autora. email, cartas, telefone, sinal de fumaca costumam funcionar. digo aqui que os probleminhas de manutencao, esses dah pra gente relevar. agora, descaso e falta de respeito - esses aih sao dificeis de engolir. e pra nao ficar atravessado demais na minha garganta, me mudo eu, parece mesmo que sou eu que estou fora do tom aqui na regiao.
a decisao tah tomada, o contrato novo assinado. to feliz em me mudar. ao mesmo tempo, eh dificil. essa foi a minha casa nos ultimos tres anos. aqui, bem aqui, vivi experiencias que a gente nao planeja viver nessa vida. e por mais que algumas delas tenham sido duras, sobrevivi a todas. carrego hoje as marcas delas, que se confundem com a marcas deixadas por essa casa em mim, como uma roncha que aparece toda vez que eu esbarro na mesa da cozinha. passo por uns dias de luto, me mudar nao eh enterrar o que eu vivi aqui, mas eh como a casa fisica fosse proprietaria de uma parte que, mudando, vou deixar pra tras.
o drama passa. a casa nova tambem tem dois quartos, eh toda de tabua corrida e ganha a adicao de uma sala de jantar. pros que vieram me visitar aqui na casa velha, aviso que a visita jah expirou o prazo de validade. eh preciso agora vir me visitar na casa nova. tem verao chegando e, logo depois, o outono mais lindo desse mundo. alguem se habilita?

meus daffodils amarelos estao quase abertos. tem uma primavera desabrochando bem ali na minha sala, entre caixas, fitas adesivas e bagunca.

em ingles, to look up to quer dizer admirar. gosto dessa expressao e a utilizo na minha cabeca em diversos momentos, mesmo quando estou pensando em portugues. porque a ideia eh mesmo essa, olhamos assim de baixo pra cima, com respeito, pra quem a gente admira. to look up to se aplica muito ao que sinto pela rita. que contraria o chico e sempre me traz o sorriso. a vejo sempre lah no alto, do alto da generosidade, do cuidado, do amor. tem rita pra todo mundo, basta abrir o coracao e estender a mao. a rita vai te estender a mao de volta e segurar bem apertado, mesmo que voce more muito, muito longe. a rita vai te mandar mensagens lindas, pra voce se sentir parte do mundo dela. jamais, ela vai te deixar esquecer do quanto voce eh importante. a rita vai te ligar todo dia quando voce ficar doente. voce vai sentir o olhar dela sobre voce, vai perceber a vibracao das oracaoes dela. e um dia, um dia qualquer, a rita manda um email e escreve um segredo, quase um cochicho no papel. e eu respondo: voce eh, rita. de coracao, de amor. esse segredo vai ser guardado, partilhado nas trocas de olhares, nos encontros poucos demais, durante os abracos sem pressa, quando a rita passar as unhas pintadas de vermelho bem de levinho nas minhas costas. mesmo que ela fizesse como diz o chico, e me levasse o sorriso, ainda assim, ela seria a rita. a rita pode tudo.