domingo, 22 de fevereiro de 2009

o canto da cidade

pra salvador, onde o mar brilha azul bem escuro
onde o povo danca na rua, ri, canta e beija na boca
que me faz de morrer de saudade todo mes de fevereiro, eu canto:


eh d'oxum
(geronimo)
nessa cidade todo mundo eh d'oxum
homem, menino, menina, mulher
toda essa gente irradia magia
presente na agua doce
presente na agua salgada
e toda cidade brilha
seja tenente ou filho de pescador
gente importante, desembargador
se tah presente eh tudo uma coisa soh
a forca que mora n'agua nao faz distincao de cor
e toda cidade eh d'oxum
eu vou navegar nas ondas do mar, eu vou navegar

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

de um lugar pro outro

to de mudanca. quem quiser saber dos detalhes sordidos e o novo endereco, favor entrar em contato direto com a autora. email, cartas, telefone, sinal de fumaca costumam funcionar. digo aqui que os probleminhas de manutencao, esses dah pra gente relevar. agora, descaso e falta de respeito - esses aih sao dificeis de engolir. e pra nao ficar atravessado demais na minha garganta, me mudo eu, parece mesmo que sou eu que estou fora do tom aqui na regiao.
a decisao tah tomada, o contrato novo assinado. to feliz em me mudar. ao mesmo tempo, eh dificil. essa foi a minha casa nos ultimos tres anos. aqui, bem aqui, vivi experiencias que a gente nao planeja viver nessa vida. e por mais que algumas delas tenham sido duras, sobrevivi a todas. carrego hoje as marcas delas, que se confundem com a marcas deixadas por essa casa em mim, como uma roncha que aparece toda vez que eu esbarro na mesa da cozinha. passo por uns dias de luto, me mudar nao eh enterrar o que eu vivi aqui, mas eh como a casa fisica fosse proprietaria de uma parte que, mudando, vou deixar pra tras.
o drama passa. a casa nova tambem tem dois quartos, eh toda de tabua corrida e ganha a adicao de uma sala de jantar. pros que vieram me visitar aqui na casa velha, aviso que a visita jah expirou o prazo de validade. eh preciso agora vir me visitar na casa nova. tem verao chegando e, logo depois, o outono mais lindo desse mundo. alguem se habilita?

meus daffodils amarelos estao quase abertos. tem uma primavera desabrochando bem ali na minha sala, entre caixas, fitas adesivas e bagunca.

em ingles, to look up to quer dizer admirar. gosto dessa expressao e a utilizo na minha cabeca em diversos momentos, mesmo quando estou pensando em portugues. porque a ideia eh mesmo essa, olhamos assim de baixo pra cima, com respeito, pra quem a gente admira. to look up to se aplica muito ao que sinto pela rita. que contraria o chico e sempre me traz o sorriso. a vejo sempre lah no alto, do alto da generosidade, do cuidado, do amor. tem rita pra todo mundo, basta abrir o coracao e estender a mao. a rita vai te estender a mao de volta e segurar bem apertado, mesmo que voce more muito, muito longe. a rita vai te mandar mensagens lindas, pra voce se sentir parte do mundo dela. jamais, ela vai te deixar esquecer do quanto voce eh importante. a rita vai te ligar todo dia quando voce ficar doente. voce vai sentir o olhar dela sobre voce, vai perceber a vibracao das oracaoes dela. e um dia, um dia qualquer, a rita manda um email e escreve um segredo, quase um cochicho no papel. e eu respondo: voce eh, rita. de coracao, de amor. esse segredo vai ser guardado, partilhado nas trocas de olhares, nos encontros poucos demais, durante os abracos sem pressa, quando a rita passar as unhas pintadas de vermelho bem de levinho nas minhas costas. mesmo que ela fizesse como diz o chico, e me levasse o sorriso, ainda assim, ela seria a rita. a rita pode tudo.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

pedacos

comprei hoje de manha um pedaco de primavera no supermercado. tao facil essa vida se a gente pudesse comprar o que quisesse, estivesse tudo disposto ali na prateleira - penso eu. moco, me dah aih um bocado desse verao que eu quero ir pra praia esse fim-de-semana. pensando bem, eh melhor viver com os desafios todos. fico de mal com o inverno assim que vira de 15 pra 16 de fevereiro e tenho que comprar antidotos pra aguentar os proximos dois meses. ainda assim, sorrio. dou uma risada besta e sigo com a senhora do carrinho cheio ateh a tampa a me olhar com um ponto de interrogacao na testa. quem serah esse tipo de gente que ri sozinha no supermercado enquanto escolhe um ramalhete de daffodils amarelos que sequer abriram?
de tarde, aproveitando o feriado do president's day, uma ida a salem. escolhi um livro na barnes and noble, a historia de um medico na irlanda. tava numa prateleira soh de literatura irlandesa, tem um capa linda. na sephora, pra me fazer feliz, procuro o rimmel da clinique, um dos poucos que nao me borra a pele depois de umas horinhas de uso. que vida facil essa em que basta um rimmel pra ser feliz. a mocinha do caixa fez uma embalagem bem bonita, de presente. valha-me nossa senhora, essa daih nasceu pra fazer isso. como eh que ela adivinhou que era um presente? agradeco como se ela tivesse mesmo me dado o presente e saio balancando a sacolinha. quem serah esse tipo de gente tao efusiva numa segunda a tarde ao comprar um rimmel?
de noite, passadas as 10, entro na cozinha. me deu vontade de fazer um bolo. seguro a vasilha pra ir mexendo a massa, uso meu whisker igual faz o curtis, aquele moco lindo do tlc que vai nos supermercados escolher vitimas (ahn???) pra ir cozinhar na casa delas. penso na adelia prado, naquele poema dos peixes, queria um cotovelo a encostar nos meus. acabo de lavar a louca que ainda estava na pia, o bolo entra no forno, comeca a cheirar. lambi a vasilha da massa, igual a quando era crianca, pra esperar o bolo assar. o cheiro se difunde, penso nos meus vizinhos - sentem o cheiro? que tipo de gente eh essa que cozinha na hora em que todos os gatos sao pardos e invade a vizinhanca com um batalhao de cheiro de chocolate?

quando os daffodils abrirem, tem foto - prometo.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

a cidade eh grande, os encontros sao fugazes. duram uns cinco minutos, umas horas, uns dias e, ainda assim, sao fugazes. um grupo de amigas se aventura, todas buscam - ninguem sabe ao certo o que.
a cidade das belas luzes, da historia, do vento atlantico frio e cortante proporciona, sim, encontros. entre uma barreira de neve e outra, em cima dos paralelepipedos do centro, um encontro toma forma. tem hora marcada pra terminar. a pressa eh de quem sabe disso.
a cidade cercada de agua por todos os lados eh palco e cenario. os atores chegam, contracenam, vao.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

gente, gente

falo o tempo inteiro de animais, plantas, fungos, virus, celulas, ecossistemas, mas meu material de trabalho, ainda assim, eh gente - meus alunos. no comeco, ha quase cinco anos, uma sala cheia de alunos era uma incognita por um bom tempo. hoje, nao: basta uma semana pr'eu perceber a dinamica, identificar as liderancas, reconhecer os personagens de cada um. de ante-mao, desvendo a trama do semestre mesmo antes do seu desenrolar. acerto quase todas as vezes, mas sao as vezes em que erro que mais me ensinam alguma coisa. no inicio desse semestre, olhei pro rapaz sentado na cadeira do meio. ele diz que quer ser professor, reclama um pouco, mostra senso critico. vai ser bom te-lo na sala de aula, penso eu. eh mais velho que a media, parece ser maduro, vai virar um lider na turma, vai estimular os mais novos. ledo engano: o rapaz que quer ser professor acha que o mundo gira em torno dos seu umbigo, se apega a pequenezas quaisquer, nao sabe analisar o todo. se frusta quando nao entende o que dizem os outros, se frusta quando todos nao concordam consigo, faz birra. pra coroar, se deixa manipular por meninos de 18, 20 anos, que provavelmente ainda nem sairam da barra da saia dos pais.

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eu trato as secretarias do departamento bem. sao duas. uma eh facil de gostar, eh doce, suave, eh aquele tipo de gente que a gente quer ter perto o tempo todo. a outra nao eh tao facil assim de se gostar, eh preciso um pouco mais de paciencia, eh preciso relevar uma coisinha ou outra. independente da personalidade, sao as duas muito competentes e o departamento de ciencias naturais soh caminha tao bem porque elas sabem o que estao fazendo. nos, professores do departamento, lidamos com elas todo dia, varias vezes, pra tudo e qualquer coisa. eu nunca esqueco de dizer muito obrigada, elogio todo o servico bem-feito, presto atencao ao que elas dizem, ouco a opiniao delas de verdade, passo na secretaria no fim da tarde pra dizer tchau, trago lembrancinhas do brasil. sou flexivel com o que pode ser modificado e pode facilitar a vida delas. alem da admiracao e respeito, a relacao acaba sendo tambem de amizade. tao simples a receita do bom conviver, que eu ateh me assusto quando a boa relacao que tenho com elas gera ciume ou insatisfacao por parte de alguem que se julga merecedor de toda e qualquer deferencia soh porque nasceu. elas de fato sao especiais comigo. mas ninguem estah observando quando eu saio do meu caminho pra ser gentil com elas.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

pelo mundo

alguma coisa hoje me lembrou a espanha. seus cheiros, o sol, os sons. fiquei com vontade de estar de novo em barcelona, de pegar aquele trem para ir encontrar com minha mae em madri, de ser por ela apresentada a madri e redondezas, de ir com ela descrobrir a andaluzia e, saindo do circuito, ir dar em merida na extremadura espanhola. por varios motivos, a espanha eh tao especial pra mim. a primeira vez que viajei sozinha foi na espanha. encontrei com a mila no meu primeiro dia em barcelona, passamos um tarde inteirinha juntas, mas ela ia embora no dia seguinte e eu passei mais quatro dias na terra de gaudi e miro. sozinha, guia na mao, de metro, de onibus, a peh, eu bati aquela cidade de cima abaixo. barcelona foi soh encantamento; ali eu descobri um pouco de outro mundo e um monte de mim mesma, sozinha numa cidade desconhecida e ao mesmo tempo muito bem acompanhada. em varios momentos, desejei profundamente que alguns dos meus amores estivesse ali comigo. nao sofrendo, porque aquela foi daquelas saudades boas, que te acompanham, fazem sombra enquanto voce caminha.
de barcelona, peguei o trem da renfe e fui pra madri, numa viagem de quase uma manha inteira de paisagens. mamae jah estava em madri esperando por mim, com tudo planejado pra me apresentar a cidade que, alguns anos antes, lhe havia sido apresentada pelo deco. parecia assim que estavamos os tres a bater perna - ali o deco isso, ali o deco aquilo - dizia a mamae a toda hora. tao especial que eh passar por lugares onde os seus jah estiveram.
de madri fomos as duas pra cordoba. gostei da andaluzia desde a hora em que desci do trem, no instante mesmo em que o sol pegou fogo na minha pele. tanta beleza eh aquela mistura de gentes e historias, uma catedral que virou mesquita e catedral de novo e tem marcas de cristaos e mulcumanos pelo chao. ruinas romanas e o alcazar dos reis cristaos, onde isabel e fernando estiveram com colombo e de onde planejaram boa parte da reconquista espanhola.
na duvida do que fazer, debatemos entre ir a sevilha ou voltar a madri e, folheando o guia, mamae sugeriu merida.
fechamos na hora o acordo e lah fomos as duas de onibus pelas estradas do interior da espanha, de cidade em cidade, pra terra do jamon pata negra. pra terra dos mais lindos mosaicos do mundo, a emerita augusta dos romanos, pra onde os soldados do imperio iam usufruir de sua aposentadoria. em merida, vimos mosaicos construidos por volta de 25 antes de cristo que ainda guardam tons vivos de vermelho, azul e dourado. casas romanas, um teatro e um anfiteatro, aquedutos e pontes sobre os dois rios que limitam a cidade. merida foi o fechamento perfeito pra uma viagem perfeita. no ultimo dia, eu e mamae fomos a igreja de santa eulalia, a menina santa de merida. um senhor chega e se ajoelha. reza e olha pra santa. soh com os olhos, sem nenhum gesto, conversa com ela. antes de se levantar, seu rosto abre-se num sorriso; ele sabe que eh ouvido...

sábado, 7 de fevereiro de 2009

a Kristyn entrou chorosa no meu escritorio, era quita ou sexta – jah nem lembro. me conta assim entre um soluco e outro: um primo, o mais novo, um acidente. fiquei ali parada, a boca meio aberta, um soluco no meio do caminho. um primo. um acidente. tudo de novo nas fracoes de segundos.
ela nao sabe que aquelas lagrimas que eu derramei junto com ela foram por mim tambem, pela minha familia. ela nao sabe que naquele abraco quem buscava amparo era eu, mesmo parecendo que eu a amparava. ela nao sabe quantas vezes o filme rodou de novo na minha cabeca – ela nao sabe. ela nao sentiu a dor na minha gargante de segurar o choro, porque eu tinha mais lagrima pra derramar. ela nao sabe que eu sumi o resto do tempo, que o relatorio que esta quase no prazo foi soh a desculpa, ateh a hora em que ela foi viajar porque era dificil encara-la, porque tinha um filme que eu jah assisti rodando na minha cabeca sem intervalo pr’eu respirar. nao, ela nao sabe. mas eu sei.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

para a mariana, mariana que nem eu. que sabe todos os segredos das palavras e como junta-las pra contar as historias mais lindas desse mundo. e que tem toda a generosidade desse mundo dentro dela, o suficiente pra achar bonito o que eu escrevo. aqui vai o poema de drummond que eu mais gosto, aquele que eu leio com o coracao apertado, como se fosse eu mesma quem nunca mais houvesse escrito.


CARTA
Carlos Drummond de Andrade


Há muito tempo, sim, não te escrevo.

Ficaram velhas todas as notícias.
Eu mesmo envelheci. Olha, em relevo,
estes sinais em mim, não das carícias

( tão leves ) que fazias no meu rosto:

são golpes, são espinhos, são lembranças
da vida a teu caminho, que ao sol-posto
perde a sabedoria das crianças.

A falta que me fazes não é tanto
à hora de dormir, quando dizias:
"Deus te abençoe", e a noite abria em sonho.

É quando, ao despertar, revejo a um canto
a noite acumulada de meus dias,
e sinto que estou vivo, e que não sonho.