segunda-feira, 31 de agosto de 2009

quando a inspiracao nao me guia as maos...

Passagem da Noite

E' noite. Sinto que e' noite
nao porque a sombra descesse
(bem me importa a face negra)
mas dentro de mim,
no fundo de mim, o grito
se calou, fez-se desanimo
Sinto que nos somos noite,
que palpitamos no escuro
e em noite nos dissolvemos.
Sinto que e' noite no vento,
noite nas aguas, na pedra.
E que adianta uma lampada?
E que adianta uma voz?
E' noite no meu amigo.
E' noite no submarino.
E' noite na roca grande.
E' noite, nao e' morte, e' noite
de sono espesso e sem praia.
Nao e' dor, nem paz, e' noite,
e' perfeitamente a noite.

Mas salve, olhar de alegria!
E salve, dia que surge!
Os corpos saltam do sono,
o mundo se recompoe.
Que gozo na bicicleta!

Existir: seja como for.
A fraterna entrega do pao.
Amar: mesmo nas cancoes.
De novo andar: as distancias,
as cores, posse das ruas.
Tudo o que a noite perdemor
se nos confia outra vez.
Obrigado, coisas fieis!
Saber que ainda ha florestas,
sinos, palavras; que a terra
prossegue seu giro, e o tempo
nao murchou; nao nos diluimos.
Chupar o gosto do dia!
Clara manha, obrigado,
o essencial e' viver!

Carlos Drummond de Andrade
faz dias jah que eu busco uma inspiracao pra escrever, mas a verdade eh que nao ha inspiracao pra esses ultimos dias. hoje eh dia 31 de agosto, dia que precede setembro, um mes que eh dificil ver chegar. setembro mudou nossa vida, entre 2005 and 2006 - primeiro numa perda esperada, embora dificil, e que seguia a ordem mais natural das coisas. depois numa perda nao esperada, sem ordem, sem nexo, sem sentido qualquer. aos trancos e barrancos, vamos todos nos aprendendo a viver com as ausencias, com a saudade, com os buracos que permeiam nossos encontros. ha pouco o que dizer. e, na verdade, a gente fala mais nos abracos, nos telefonemas, nos pensamentos de todos nos juntos. setembro eh mes de sentir saudade...

ainda assim, a vida segue. do mesmo jeito que setembro nos levou, setembro nos trouxe: dia 3 faz aniversario a pituca, dia 19: minha mae e dia 27: o bilotinho, meu afilhado.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

o jonas, meu primo, me escreveu hoje dizendo que aprendeu com o vovo firmino que o que tem que ser tem muita forca. essas palavras ressoam no meu cerebro desde a hora em que as li. palavras de tranquilidade, feh e esperanca.
nao, nao existe mesmo coincidencia. o universo conspira. e eh totalmente a favor.

pelo mundo

"um homem precisa viajar por sua conta, nao por meio de historias, imagens, livros ou TV. precisa viajar por si, com seus olhos e pes, pra entender o que eh seu, para, um dia, plantar suas proprias arvores e dar-lhes valor. conhecer o frio para desfrutar o calor, e o oposto. sentir a distancia e o desabrigo pra estar bem sob o proprio teto.
um homem precisa viajar pra lugares que nao conhece pra quebrar essa arrogancia que nos faz ver o mundo como o imaginamos e nao como simplesmente eh ou como pode ser."
amir klink

somos doze netos estradeiros, jah dizia minha avoh. gostamos todos nos de bater perna por aih, por pouco ou muito tempo, todos jah saimos de casa, estivemos por aih. gostamos do mundo. nesses dias em que volto meu pensamento pro lugar de onde venho, tenho pensado no valor dessas experiencias, no que isso significa em minha vida, no que mudou em mim depois de tantos anos longe de casa, dos meus. e comparado ao que vejo nos que nunca sairam do proprio canto, na diferenca das conversas, da largura dos horizontes. esses anos longe nao me fazem melhor nem pior que ninguem, mas me deram mais material pra entender o mundo, entender pessoas diferentes, de habitos diferentes, sem gastar tanta energia estranhando ou questionando aquilo que eh diferente simplesmente porque eh. nao precisar encontrar o bom ou o ruim no diferente e, sobretudo, aprender a conviver com e ateh a adotar algo do diferente que lhe cabe eh libertador.
aprender a viver no mundo, aprender a se virar, aprender que o que eh importante pra voce e pros seus pode ser totalmente insignficante pra alguem de outro canto do mundo faz com que voce entenda mais aquilo que ve no canto do mundo de onde vem. tudo o que vivi, primeiro saindo do nordeste rumo ao sudeste e depois mudando de pais, me fez entender que o que chamo de casa pode ser varios lugares. posso ser feliz aqui, em fortaleza, em salvador, em vicosa, em halifax, em paris ou em merida. posso encontrar casa em todos esses lugares, posso fazer amigos, construir ligacoes solidas e duradouras. e nao, nunca devo esquecer quem eu sou, de onde venho, de quem venho.
acumular essas experiencias soh me faz ser mais quem eu sou, saber mais de onde venho. andar esses caminhos me prepara pra voltar pro lugar de onde eu venho, viver mais uma vez junto aos meus. jah posso comecar a plantas minhas arvores.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

por email, chegou a previsao. num dia de sol da quase primavera do rio, ela me fala da alegria dos dias de calor no tropico, fala de felicidade, preve que eu vou ser feliz. nao, nao: nao tenho muitas ilusoes a respeito de tudo - vai ser dificil, a adaptacao vai ser um processo lento e, por vezes, doloroso. vao haver, sim, aqueles momentos em que eu vou maldizer, falar que nao valeu, pedir pra voltar. vou sentir saudade, vou mesmo fraquejar. mas nao consigo conceber ficar parada no tempo e no espaco por medo de seguir. e esses hao de ser soh momentos, pedacos, que completam o todo.
e eu sei bem qual eh o todo - nomeio seus componentes um por um de noite antes de dormir, quando peco a quem pode mais que eu que os guarde, que os guie, que os ilumine. que nao lhes deixe faltar forca pra seguir em frente, porque assim tambem eu nao perco o rumo - minha forca vem deles.

em tempo: o verao do norte do continente americano chegou aos 45 minutos de segundo tempo, com gosto de nem chegou e jah vai embora e, em dias como hoje, abafados e turvos, tem cara de jah vai tarde.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

porque eu nao tenho medo de estagnar no tempo, morrer de parada historica (*), embotar, encruar, involuir. porque mesmo quando eu passo por momentos dificeis, mesmo quando me sinto soh e parece que os meus, aqueles que sao mais meus, estao longe - nao no sentido geografico - nao perco a vontade de viver, a forca de seguir, a gana de buscar mais. porque mesmo quando eu estou mais cansada, tao cansada que me doem todos os musculos do corpo, ainda nesse momento tenho energia, forca, sonhos que nao sossegam nunca e estao sempre perambulando no meu pensamento. porque mesmo nos dias mais escuros e no verao menos ensolarado e mais chuvoso da nova inglaterra, eu acho um motivo pra me levantar, vencer a inercia nunca eh um problema pra mim. problema pra mim eh conseguir parar, me aquietar, nao pensar nada, nao ter mil e uma coisas ao mesmo tempo desfilando pela minha cabeca.

sexta-feira passada, fui no salao e avisei pra elizabeth: sim, vou cortar o cabelo e vai ser bem curtinho. eu queria algo moderno, que tivesse cara de corte novo, que ficasse diferente de todo mundo que anda por aih com os cabelos iguais a alguma celebridade que eu, propositadamente, ignoro. e foi isso mesmo que a elizabeth fez. nao, eu nao tenho medo de mudar - mesmo sabendo que mudancas me custam energia e podem trazer sofrimento. desde a mudanca do corte de cabelo ateh a mudanca maior, mais radical que afeta a vida.

* morrer de parada historica: expressao da tia marly, pra se referir aqueles que vivem do e no passado.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

celebrar:

- a agencia nacional de saude e sua notificacao magica, que fez o plano de saude voltar atras e cobrir a cirurgia.
- a cunhada, dona do senso de cidadania, que sempre se reporta as agencias reguladoras, pra que as coisas funcionem do jeito que tem que funcionar e que inspirou a ideia de envolver a agencia nacional de saude nessa historia.
- o irmao que foi pra salvador e tomou a redea em suas maos, mandou e-mail, falou com o medico, fucou daqui, dali, e conseguiu.
- as minhas primas, e a nossa relacao proxima, mas leve, baseada no amor, na compreensao. elas sempre sabem quando eu preciso d'um afago, um telefonema.
- o cumpadre, a comadre e as muitas vezes que eles me ligam pra conversar, as vezes tarde da noite, mortos de sono, soh pra me dar um beijo.
- a pipoquinha, menina de personalidade e coragem, que do alto dos seus sete aninhos, pediu a mae pra cortar o cabelo curto, e, mesmo com as criticas das coleguinhas, estah feliz da vida de visual novo.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

cabimento

quando eu crescer, quero ter uma casa bem grande. nao assim grande nos metros quadrados, mas grande no que ela engloba, abarca, acomoda, ajeita. grande que caiba meus grandes amores, minha intensidade, minha vontade de viver, minha musica, meus barulhos todos, meus pinotes pra lah e pra cah. que acomode quem quiser chegar, se juntar. pra onde todos saibam que podem ir - eh soh ir chegando, que cabe.
que tenha uma mesa bem grande na cozinha, que esse seja o canto onde todos se reunam. e quando todo mundo estiver sentado partilhando sabores, algo mais seja dividido. se sentar pra comer ha de ser soh a desculpa pra todo mundo passar um tempo junto. nao tempo pro-forma, soh pra ingles ver. mas tempo de verdade, em quantidade e qualidade.
e que, mesmo naquela imensidao de pessoas e sentimentos, que nela eu nunca me sinta soh.