segunda-feira, 28 de setembro de 2009

referencia

fernando pessoa, no seu Livro do Desassossego diz:

"Escrevo triste, no meu quarto quieto, sozinho como tenho sido, sozinho como sempre serei. E penso se a minha voz, aparentemente tao pouca coisa, nao encarna a substancia de milhares de vozes, a fome de dizerem-se de milhares de vida, a paciencia de milhoes de almas submissas como a minha ao destino quotidiano, ao sonho inutil, a esperanca sem vestigios. Nesse momentos meu coracao pulsa mais alto pela consciencia dele. Vivo mais porque vivo maior."

porque, como diz adelia prado, soh pode com cantiga triste que nao perdeu a alegria.

sábado, 26 de setembro de 2009

ainda exercitamos a espera e processamos tantas informacoes novas enquanto isso. nos ainda temos medo. dormir nos fez bem, embora nem todos tenhamos tido chance desse luxo. nos damos a mao nesse momento, buscamos apoio uns nos outros. eu busco apoio no alem-mar, cruzo oceanos na direcao das palavras de carinho, de gente que consegue ver de fora e me ajuda a enxergar a luz.
agradeco. o apoio de quem nao conhece a menina que estah no hospital, mas que eh capaz de tanto sentimento. os alunos que entendem a necessidade de uma mae ser soh mae e esquecer que eh professora. tudo o que veio dos meus, em formas diversas, grande que nao se mede, indispensavel.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

ainda nao era 5 da tarde quando eu parei naquele sinal. assim, grampeada ao banco do carro, observei o sinal dos carros que dobravam ficar verde, o homem estranho atravessar bem na frente deles, dos carros que cruzavam bem a minha frente. daquele jeito, pesando 250 kilos sobre meu banco de carro, prendi a respiracao, esperando o impacto. e vi, gracas a deus, o carro mais a frente parar a milimetros de distancia do homem.
e fiquei rindo do homem, fazendo o gesto inconfundivel de quem manda alguem tomar banho ou coisa que o valha. respirei fundo e aliviada, passei no correio e me mandei pra casa - estava mesmo na hora do dia acabar. eu ainda tinha ensaio do coral, mas isso eh prazer puro, diversao. o que eu nao sabia era que meu dia ainda nao estava no fim de jeito nenhum. e que eu ainda iria ajudar minha amiga a levar a sua helena ao hospital. helena, a menina dos olhos verdes de gato emoldurados por longos cilios. a menina de personalidade forte do alto dos seus 4 aninhos que gosta de um chamego e me diz que loves me very much. e que a gente iria ouvir coisas que pais, filhos, tio (mesmo que posticos) nunca querem ouvir envolvendo alguem a quem se quer bem.
mais do que a falta de sono, o que me esquenta a cabeca hoje eh o incerto e a possibilidade de nao ser o que eu espero que seja. eh saber que a gente pode ser, subitamente, roubado de algo que a gente sabia como certo, ia acontecer. de nao ter o que a gente sempre pensou ser absolutamente normal.
nesse momento, testes e exames estao sendo feitos e, a nos, soh resta esperar. e torcer, e rezar e pedir que nao seja nada do que se falou ontem naquele quarto de emergencia de hospital, as 2 e meia de uma longa madrugada. e que essa forca maior que existe no universo - a quem damos muitos nomes diferentes - conspire mais uma vez, definitivamente dessa vez, a nosso favor. e faca tudo voltar ao normal.
vovo firmino me contou a historia algumas vezes... numa epoca instabilidade politica no pais (nao lembro exatamente quando), um amigo dele precisa sair do brasil - exilar-se. ele, meu avo, junta um tanto de dinheiro e vai se encontrar com o amigo, arriscando ser preso, mas entrega ao amigo o dinheiro que lhe ajudaria no que estava por vir. o amigo pergunta: quando eu te pago? isso nao importa, eh a resposta do meu avo. valores como esse, historias como essa fazem parte da recordacao forte do meu avo. mais que isso: tenho o imprinting desses valores em quem eu sou hoje. ser leal, generosa e confiavel eh importante pra mim.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

o ceu de setembro

o dia era daqueles que eu torco pra nunca acabar. era um dia em que eu via da minha janela o ceu bem azul, mesmo que houvesse nuvens, chovesse canivete, nevasse. sem precisar esforco, eu sabia da forca do que vem dentro de mim. entre uma musica e outra, das que inundam o meu caminho; entre um aluno e outro, desses que me ocupam os dias, nada pode mudar minha vontade, minha tenacidade. nada abala minha certeza de que, sim, o ceu eh azul. mesmo que a maioria nao veja. mesmo que nao seja de verdade.
a pessoa passou do meu lado de mau humor. num dia como aquele nao me abalou. tornei-me imune: pode falar, olhar, medir de cima embaixo e nada me atinge. eh passado hoje o torpor desse ultimo verao, que veio todinho da quentura da minha propria cabeca. emergir desse sono estival nao foi facil, contei e conto com ajudas muitas, de tantos lados. mas eh fato hoje e me mostra pra qual time eu jogo na vida.
me pergunto todo dia se a gente escolhe mesmo como vai viver ou se a vida nao nos dah muita saida em varios momentos. nao sei a resposta. alguma coisa me puxa pro time dos que nao tem tempo a perder, dos que querem seguir em frente.
voltei a cantar. num coral agora, que eh pra ser divertido. sou a mais nova do grupo que se reune toda quarta a noite em groveland, pra cantar junto e dar boas risadas. de tudo, falta soh uma coisa: cantar em portugues. minha lingua mae me faz mais falta cantada do que falada.

p.s. do tipo "pena que soh descobri agora": um queijo grego que nao derrete e range entre os dentes igual o nosso queijo de coalho. ontem fiz um baiao-de-dois que valha-me minha nossa senhora! eh bom nunca perder os bons costumes.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

da espanha aos eua em trinta segundos


quando fui pra espanha, ano passado, fiz as compras das passagens de trem atraves do site da renfe, a companhia ferroviaria do pais. meu email ficou registrado nos arquivos deles e agora recebo, vez em quando, emails da renfe avisando sobre promocoes, descontos, novas linhas, o que quer que seja que eles queiram divulgar. essa mistura de email com tentacao e tortura vem agucar minha vontade de voltar a espanha, pais que caiu nos meus amores, vem me lembrar os sabores, o cheiros, as imagens daquela terra e, hoje, veio me avisar que o verao no hemisferio norte acaba jah, jah. o email de hoje tratava da ultima promocao desse verao, lembrando-nos que, sim, estamos a duas semanas do comeco oficial do outono.

era de se perceber, pelas noites mais frias, pela jaqueta leve que a gente poe pra sair de casa de manha (e tirar lah pelas dez, por enquanto), que o verao estah indo. mas, mesmo tendo voltado as aulas - marco maior de que o verao se foi - foi dificil cair a ficha de que o outono jah bate a porta. esse ano praticamente nao teve calor. fez frio ateh o meio de junho, choveu ateh o inicio de julho e calor mesmo, desses da gente achar que estah no piaui, soh por uma semana. foi bom, por um lado: a conta de energia nao sofreu com o ar condicionado ligado, um ventilador resolveu pras noites mais quentes. e ruim por outro: cade? eu me pergunto. cade o verao, cade a praia, cade os passeios em boston sem congelar?

vi hoje no parque as primeiras folhas a se colorir, preludio de outono. vai comecar a estacao mais linda de todas do hemisferio norte, quando as folhas todas mudam de cor, e a luz que vem do sol reflete pra gente os tons mais lindos de vermelho, cor-de-laranja, amarelo, roxo, rosa, magenta. um presente que a gente ganha antes do inverno frio e longo.

esse eh, muito provavelmente, meu ultimo outono como residente da nova inglaterra - pelo menos nessa fase da minha vida. fui tomada hoje, enquanto corria no parque, da melancolia da despedida. vivi tantas coisas boas nesses ultimos anos! curti muito os outonos, me deslumbrei tantas vezes com o cenarios cinematograficos a minha volta que meu vizinhos, tendo crescido aqui, tomam por banal, corriqueiro. mas mais que a paisagem espetacular, o que eu vivi eh que importa de fato. as marcas estao aqui comigo, nao sou mais a mesma pessoa que desembarcou aqui anos atras. o que sou hoje passa necessariamente pelas paisagens de new hampshire e massachusetts, pelas pessoas com que convivi, pelos amigos que fiz e que partilharam comigo desses momentos.

o ciclo ainda nao se encerrou, ainda falta um tempo. este outono que vem chegando marca o inicio desta temporada de despedidas. eh, sim, hora de partir rumo ao sul.

domingo, 6 de setembro de 2009

familia tem sido um tema recorrente nesse blog; quem le deve jah estar de saco cheio. mas a referencia eh muito forte, a relacao eh (quase sempre) muito leve, o amor muito grande e, sobretudo nesses ultimos meses, a atencao e o carinho tem sido impares. eu nao sei o segredo, nao sei ao certo colocar em palavras o que fez com que os doze netos da dona zelinda e do seu firmino se quisessem tanto bem, conseguissem manter contato mesmo, ou principalmente, quando estao tao espalhados e encontrassem tanto prazer em estar juntos, em partilhar momentos, sensacoes, sentimentos, historia.
ao que nao me eh palpavel, eu reajo com a emocao - tambem essa, uma heranca familiar. hoje, depois de falar com o dani e com o carlao, me veio uma vontade enorme de chorar, de agradecer a deus, ao universo, a minha mae, a quem quer que seja que tenha me colocado no meio desse povo. e eu chorei sim. enquanto acendia uma vela de agradecimento a nossa senhora, nos pes daquela imagem pequeninha, presente da mae, numa afirmacao da minha feh.
nessa semana em que todos nos lembramos dos pedacos que nao estao mais por perto, estivemos mais perto do que nunca. conversamos, lembramos, contamos uns aos outros historias de ontem - planejamos pro futuro. eu tenho sim, muita feh de que eles olham por nos de onde estao. acredito, sim, que eles estao juntos, que nos guiam, que iluminam nosso caminho.
parte da minha coragem de viver vem da consciencia de que, aconteca o que acontecer, decida eu o que decidir da minha vida, eles vao estar lah. posso estar aqui ou aih, tanto faz e nao importa.

do que vou sentir saudade



essa aqui eh a trilha do winnekenni park, onde eu vou correr quando a chuva permite. onde a musica que sai do meu ipod me leva pra alem desse caminho.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

a caixa

faz um tempo jah que eu inventei as caixas nos aniversarios da lenoca, inesuca e danielzinho. era uma forma de me fazer presente mesmo tao longe, de mostrar pra eles o quanto lhes quero bem e de diminuir essa distancia grande e ingrata que nos separa. alem da curticao dos telefonemas depois, de falar de cada uma das bugingangas que vao dentro da caixa, tem ainda as fotos que o danico tira e me manda, pr'eu ficar aqui babando nas belezocas se esbaldando com a caixa que a tia mari mandou.
e eh incrivel como eles percebem o recado! ontem, a pituquinha antes de dormir, juntando as bugingangas da caixa que ainda estavam sobre a cama, falou assim pra mae:
- mae, a tia mari eh uma amigona. ela soh pensa na gente, nao pensa em mais nada nesse mundo, soh na gente.
soh mesmo as criancas pra tanta percepcao e tanta simplicidade!