sexta-feira, 1 de julho de 2011

eu não sou daqui, marinheiro só

mais do que ignorar e seguir adiante como se não fosse comigo, a hostilidade de fortaleza me magoa, me dói fundo, me entristece. pensei que fosse me acostumar e, talvez até passar a fazer igual, como vejo muitos dos meus fazerem. mas não, ao invés disso, volto pra casa diariamente chateada porque a moça do supermercado não me respondeu o boa tarde, o carro atrás de mim buzinou porque eu deixei que um pedestre atravessasse a rua ou qualquer outra gentileza que eu tenha tentado fazer, sempre recebida pelos outros com impaciência, desconfiança ou algum outro tipo de irritação. por aqui, vamos na contramão do mundo, onde se tenta interagir mais, criar comunidades, viver de maneira o mais comunal possível. busca-se, por aí, o pessoal e íntimo - como saber de que chão saíram o pepino e o tomate que você comeu na salada do almoço, como ajudar a pintar a escola do seu filho, como se juntar pra bater fotografia junto, como usar o espaço da associação de moradores da cidade ou do bairro pra ensaiar o coral. e como mais um monte de outros exemplos e histórias que eu vivi e trago comigo.
queria me sentir capaz de multiplicar esse efeito, queria me sentir responsável também pela modificação, ainda que incipiente, da forma como se estabelecem as relações sociais entre estranhos nessa cidade que eu, afinal de contas, escolhi pra mim. queria concordar com um primo que me disse que aqui ainda se tem mais a fazer que lá, que os desafios são maiores, mais instigantes e que eu tenho mais a contribuir aqui que lá. nunca senti falta de ideais lá, nunca senti que havia pouco a fazer e nunca deixei de me sentir instigada pelos desafios - diferentes dos daqui, é claro - que apareciam no meu caminho.
na verdade, sinto como se aqui não houvessem desafios pra mim. ou melhor, como se o desafio maior aqui seja interno, pessoal, tão só meu. pouco posso contribuir, há pouco pr'eu fazer aqui simplesmente porque eu não sinto a pertença. ainda me sinto, às vesperas de fazer um ano da minha chegada, como se fosse estrangeira nessa terra que abrigou meus antepassados e que eu pensei ser minha também. eu sempre soube que não tinha raízes e, portanto, poderia me fixar em qualquer lugar que quisesse. e nunca, em nenhum dos lugares por onde andei, me senti tão forasteira.

2 comentários:

  1. ô amor...
    entendendo totalmente teu sentir, sentindo junto... fico aqui, sem ter o que fazer. e pensando que há problemas diferentes em contextos diferentes: aqui, por exemplo, todo mundo responde ao bom dia, todo mundo sabe o nome do teu cachorro, todo mundo comenta o jogo de ontem, há um clima de 'cordialidade' por todo lugar, mas ele não invade as casas, as vidas reais. é só cordial. não é de verdade.
    e assim nos vamos vivendo de amor.

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  2. é, babi, cada lugar tem suas questões. ou melhor, a gente sempre encontra as questões de cada lugar. o que a gente tem que escolher é que questões - de que lugar(es) - a gente está disposto a viver, tolerar, processar, lidar no dia-a-dia.
    mas, olha, me sentir entendida, saber que vc legitimiza o meu sentimento é muito importante pra mim. então, só por isso, vc já fez alguma coisa. te amo por isso e por outras muitas coisas.

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