segunda-feira, 22 de março de 2010

morro dois irmãos

gosto por boa música na minha família é hereditário. papai cantou ontem pra mim, ao telefone, e fui dormir e acordei embalada pela canção do chico.
e a canção diz assim:


Morro Dois Irmãos

Dois Irmãos, quando vai alta madrugada
E aos teus pés, vão se entregar os instrumentos
Aprendi a respeitar tua prumada
E desconfiar do teu silêncio

Penso ouvir a pulsação atravessada
Do que foi e o que será noutra existência
É assim como se a rocha dilatada
Fosse uma concentração de tempos

É assim como se o ritmo do nada
Fosse sim todos os ritmos por dentro
Ou, então, como uma música parada
Sobre uma montanha em movimento

Chico Buarque


passei o dia a catarolar...

domingo, 21 de março de 2010

paciência

eu gosto de gente, de barulho, de confusão, de música, de cores muitas. gosto de gente chegando, se abancando, ficando. estar só pra mim, quase nunca é opção. e sempre é um exercício. é sempre suado, estar só. invento jogos comigos mesma, invento realidades paralelas, brinco de ser alguém que eu não sou. brinco que o mundo não é só silêncio. e, lá pelas tantas, cansada do jogo, invariavelmente, ligo o som. nesses momentos, só a música preenche.
ainda bem que agora eu posso contar o tempo de trás pra frente. conto os dias que faltam para, e não os dias desde que. esse stand by absoluto que se instalou ao meu redor sabe que vai chegar o dia de acabar. eu também sei. e busco fundo a paciência que eu não tenho, porque, como a menina espilicute que eu fui um dia, tenho pressa. e pressa é incompatível com paciência.

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helena, a menina dos olhos de gato, me pergunta:
- titi mari, does it take long to get married?
- what do you mean, helena?
- i mean, does it take long for me to get married?
- yes, you will have to wait a few years...
- ok - e segue brincando com seus legos.
sabe ter paciência, a helena.

domingo, 14 de março de 2010

foi em 2005 que comecei a aprender o valor de boas lembranças.
vovô fazia aniversário em março. dizia não ligar pra data, se fazia de durão, mas esperava, um por um, os netos ligarem. não sei exatamente quantos anos ele faria nesse próximo 16 de março, mas sei que seria mais doce, mais generoso, qualidades que ele ganhava em proporção geométrica com o passar dos anos.
filhos e netos eram pra ele motivo de orgulho. nossas realizações, sobretudo nossas realizações adultas era acompanhadas de perto, com vibração ímpar. sabia a colocação de cada um no vestibular, sabia a idade ao completar o doutorado, o mestrado, a graduação. sabia salários. mas sabia mais que isso. sabia o que me motivava, sabia meus objetivos, sabia o que eu buscava nessa vida.
princípios e valores, como lealdade, ética e honestidade, me foram ensinados por ele. aprendi com as histórias que ele contava, com os sermões que ele dava. sobretudo, aprendi vendo como ele agia com as pessoas. meu avô liderava pelo exemplo.
aprendi com ele o valor da felicidade pequena e simples. no fim de sua vida, limitado pela doença, viveu com plenitude as pequenas coisas da vida. se alegrava imenso com uma visita, um telefonema, uma massagem no pé, a fisioterapia da lorena. vivia através da gente, viajando, defendendo tese, passando no vestibular com cada um de nós. curtia a arca que os netos mais velhos inventaram pra manter a família junta e se enchia de orgulho ao nos ver todos próximos e amigos. nos seis anos em que pouco saiu de casa, reclamou muito pouco. nunca vou esquecer a cena: saindo de casa pra ir ao médico uma certa vez, ligado no oxigênio, bricava que a tia neile era a comandante e ele, só um tripulante, rindo de orelha a orelha.
dia 16 de março é dia de sentir saudade. mas é dia de curtir as boas lembranças. é dia de me lembrar que a felicidade de verdade é pequena, é simples, e é muito mais fácil de se encontrar do que a gente consegue, normalmente, enxergar.

sábado, 6 de março de 2010

mares de morros

a casa está nas gerais, num vale, entre montanhas arrendondadas, cobertas de uma mata verde. ali, naquela casa, encontrei um bocado do que eu sou hoje. daquele lugar, tenho saudade sempre. daquele lugar, sou parte sempre. pr'aquelas pessoas, eu volto sempre.
em maio de 2009, depois de dois anos sem aparecer, senti lágrimas me subirem aos olhos ao adentrar na cidade. parecia que eu tinha estado ali na semana anterior; os sons, os cheiros, a luz, tudo me era familiar. pouco depois, eu chegava à casa. tinha cheiro de pão de queijo, a casa àquela hora. tinha música tocando, havia braços abertos, beijos muitos, alegria tanta que não cabia nem na gente. a minha sensação era de pertencer. ali, estou em casa.
mais tarde, e ao desenrolar dos dias, a casa tinha cheiro de cada um dos meus quitutes preferidos. marly disse à mila que aviava meus pedidos, um a um. mas pra mim, era mais que isso. mais que meus pedidos aviados com amor, éramos nós todos juntos. éramos nós todos a quentar fogo na cozinha até de madrugada, a sentar na beirada da horta pra esperar marly passar o filé. éramos nós, todos juntos. e parecia que tinha sido ontem a última vez.
amanhã, vou ligar, vou falar com quem mora naquela casa que me acolheu naqueles anos todos. vamos falar de amor. e vai parecer que foi ontem a última vez.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

feliz ano novo

no país tropical, abençoado por deus e bonito por natureza: tem-se por costume só começar o ano depois do carnaval. antes, estão todos meio de férias. depois, todo mundo se apruma, todo mundo começa a colocar em prática suas listas de fim-de-ano, todas as resoluções do mundo tentando sobreviver à pressa nossa de cada dia.
é bem verdade que meu ano começou aos 20 e poucos de janeiro, quando entrei naquele avião rumo ao norte geográfico, deixando pra trás meu norte sentimental. até 20 e poucos de janeiro, meu tempo estava parado, impossível de ser contado em minutos ou dias. meu tempo era contado em conversas, em olhares, em abraços, em banhos de mar ou na piscina da serraninha. lá, meu tempo valia tanto que eu conseguia viver muitas vidas em uma: ali tudo tinha a intensidade do muito.
minha lista pra 2010 é muito mais curta do que a de outros anos. depois de um 2009 de pernas quebradas, quero pouca coisa. mais que pouca coisa, tudo o que está na minha lista é simples. em vez de paris ou milão, eu sonho com uma mesa de café-da-manhã posta em fortaleza, em baturité, na joatama, na taíba. podemos até ser muitos ao redor da mesa. mas a nossa conversa é simples, é cotidiana, é da partilha mais sem ambição desse mundo. podemos nos presentear com o luxo da simplicidade do que é rotineiro, porque somos ligados com profundidade. precisamos de poucas palavras porque temos muito sentimento. e de sentimento não se diz, sentimento é indizível.
foi mesmo assim que 2010 começou. éramos poucos naquela praia. falamos do mar, do fogo, e entre beijos e abraços, nos calamos pra sentir. entre pular uma onda e dar um abraço, eu me calei pra chorar, pra deixar saírem de mim as impressões de 2009. e foi assim que, começando 2010, com tudo que é absolutamente imprescindível perto o suficiente pra que eu pudesse sentir, entendi que tudo o que eu preciso é pouco, é simples. pra 2010, eu quero que sejamos todos felizes. e nada mais.

ps: no telefone, ela me disse que o ruim é quando eu to lá e o tempo passa muito rápido. e eu me dei o presente de poder responder-lhe: se preocupa não, meu amor, que o tempo vai passar na medida certa a partir de junho.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

por um fio

conversei com ela hoje. eu a morrer de frio aqui, um mundo todo branco de neve ao meu redor, ela a morrer de calor lá, na cidade que se vê todo dia abençoada pelo cristo. nós duas, ligadas por esse fio invisível que a maioria chama de amor, entendemos que o sentimento é mais legal quando reforçado pelas atitudes: atenção, cuidado não fazem mal a ninguém. contei-lhe que relações superficiais nao me interessam, não invisto mais tempo nelas. ou em quase nenhuma delas.
e foi só eu e ela encerrarmos nossa conversa que o telefone tocou novamente: era ele. eu e ele, também ligados pelo fio invisível. não é nada, ele diz, só saudade. só vontade de conversar, contar as novidades da semana, partilhar o cotidiano, me contar dos meus três amores mirins.
e eu aqui registro: só saudade? saudade não é nunca só, pouca, saudade não pode ser nunca minimizada. saudade é sempre grande, acompanhada. saudade é e pronto.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

saudade

maria bethania cantou hoje, na minha casa, os versos do gilberto gil:

se eu morresse de saudade
nao poderia dizer
que bom morrer de saudade
e de saudade viver...

e minha saudade ficou bonita, embalada, acalentada.